Em exclusivo a O JOGO, Alex fala sobre os primeiros meses em Manchester, faz a análise ao FC Porto que deixou, desfaz-se em elogios ao sucessor e conta tudo o que foi sentindo num defeso muito agitado.
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Alex Telles não precisou de pensar para aceitar de imediato o desafio que O JOGO lhe propôs: dar a primeira grande entrevista desde que trocou o FC Porto pelo Manchester United, em outubro.
O "carinho e gratidão" que guarda pelos dragões, repetido várias vezes nas próximas linhas, foram também parte dos motivos que encontrou para explicar por que aceitou um novo desafio e para contrariar quem escreveu que o brasileiro forçou a saída. É mentira, garante, com a mesma convicção com que se debruça sobre a atualidade dos azuis e brancos, desde Zaidu, que chegou para lhe suceder, a Otávio, Corona e Sérgio Oliveira, que vê melhor do que nunca. Por fim, o United, onde encontrou um super Bruno Fernandes e onde já se afirmou.
Viveu mais de quatro épocas muito intensas no FC Porto, aparentemente com uma ligação muito forte ao clube, até a julgar pela forma como se despediu dos adeptos. Que marca levou para Inglaterra?
-Foram quatro anos, quase cinco, muito intensos, anos que mudaram a minha vida de forma muito positiva. Só tenho lembranças maravilhosas do clube, guardo tudo com um carinho muito bom. Não foi fácil deixar o país e o clube, porque me sentia muito bem e muito feliz. Mas foquei-me na minha profissão e nos meus sonhos particulares e segui o caminho.
Escreveu-se que vincou bem a vontade de sair do FC Porto. Foi assim ou a transferência foi mais uma questão de oportunidade?
-Nunca falei em sair, o presidente sabe disso. Isso porque me sentia muito feliz e à vontade, estava a realizar muito sonhos no clube, a nível coletivo e individual, mas todas as profissões têm sonhos e objetivos e nunca escondi que a Premier Legue era um sonho de criança e um sonho de atleta que sou. Esperei a oportunidade certa, mas nunca deixei de fazer o meu presente, de fazer valer a pena o momento em que estava no clube. Por isso sou muito grato ao FC Porto, aos portugueses e a todo o país, especialmente no Norte, que sempre me deram muito carinho para chegar onde estou hoje.
"Nunca forcei a saída. Deixei que as oportunidades falassem por si e sempre fui fiel ao presente"
Falou-se que tinha forçado a saída do FC Porto. É, então, mentira?
-Nunca forcei a saída do FC Porto, de maneira nenhuma. Deixei que as oportunidades falassem por si. Querendo ou não, nunca cheguei a ter uma palavra definida, porque sempre me foquei muito no meu trabalho e deixei as coisas extra campo para as pessoas que respondem por mim. Sempre fui muito fiel ao meu trabalho e ao presente e nunca pensei no futuro. Deixei as coisas acontecerem da melhor forma possível.
Isso explica que tenha feito as três primeiras jornadas desta época... O primeiro jogo [Braga] foi muito bom, mas a despedida [derrota com Marítimo] não foi a desejada...
-Nem imaginava que seria uma despedida. Muita gente falou que eu já tinha acordado a saída, que joguei por jogar, às vezes falam demasiado, mas quem me conhece sabe que não havia nada. Joguei totalmente focado e concentrado no meu trabalho e o próprio Sérgio Conceição sabe isso, não deixaria um atleta jogar se não estivesse 100% focado no objetivo. Joguei como nos 195 jogos que fiz pelo FC Porto. Já fiz tantos golos de penálti, falhei outros também, infelizmente falhei no último... não fui feliz. É um clube que nunca esquecerei. Mas prefiro guardar as boas lembranças como o primeiro jogo do campeonato, que me deu dois golos e uma assistência. São as lembranças que ficam
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Vamos supor que não tinha saído e ficava a um ano de terminar contrato. Aceitaria discutir a renovação com o FC Porto?
-Claro que sim. Nunca falei que queria sair. Todos sabem o carinho que tinha e tenho com o clube, a gratidão com os adeptos, que é recíproca. A partir do momento em que chegam as oportunidades, isso mexe com qualquer atleta, com qualquer pessoa de outra profissão, não só comigo. A partir do início dos rumores, que ia para lá ou para cá, nada mudou. Tanto que já se falava há muito tempo e fomos campeões e ganhámos a Taça e nunca me atrapalhou de modo algum. Fico feliz por ser muito valorizado, mas sempre fui aberto a tudo. Independentemente de sair ou ficar, sempre fui muito aberto a tudo e a receber qualquer tipo de proposta.
Vocês estão sempre sujeitos a ver todos os dias o nome entre rumores na Imprensa. No seu caso, desde o PSG, foi quase todos os dias. Como se consegue manter o foco?
-Confesso que não é fácil acordar todos os dias e ver o meu nome associado a outros clubes. Pior, muitas vezes não sendo verdade. Aconteceu muito isso em Portugal. Não ter voz para contrariar isso é chato. Mas eu sou muito focado no meu trabalho, não gosto de fazer as coisas pela metade, não gosto de fazer as coisas mal. E tinha e tenho uma gratidão enorme pelo FC Porto e de mim não iria sair outra coisa que não dar o meu melhor. Não havia outra saída. Tenho um grupo de pessoas que trabalham para mim e me deixam seguras e tranquilas para me focar no meu trabalho nos treinos e nos jogos. O Sérgio era e é muito exigente e essas coisas não podiam atrapalhar de forma alguma. Como ele dizia, e era verdade, o mercado ficava à porta do Olival.
"Com Conceição elevei os meus números estatísticos e o número de jogos também"
Como foi a última conversa com Sérgio Conceição e com o presidente, na altura da despedida?
-Na verdade foi bem rápida. Sempre deixei muito claro, e o presidente sabe, que não queria sair livre do clube. Nunca quis sair livre do clube. Quando cheguei disse que queria deixar um legado e, em todos os clubes onde entrei, saí pela porta da frente. No FC Porto, por quem tenho tanta gratidão e carinho, não queria que fosse diferente. Então não queria sair dessa forma. Deixe as oportunidades aparecerem, tanto para ficar como para sair, e o meu trabalho seria bem feito ate ao último dia. Deixei isso bem claro. Falei com míster, ele deu a sua opinião e ele sabe da importância para um jogador estar na Premier League. Foi uma conversa totalmente aberta e sincera. Tenho um carinho e uma gratidão imensos pelo míster e pelo presidente.
"Exigência de Sérgio é combustível para elevar o nível"
Alex Telles não sabe quanto teria rendido no mercado se não fosse a pandemia. Mas sabe que, em quatro anos, evoluiu muito e que Conceição tem boa parte do mérito.
Já falou algumas vezes sobre a exigência de Sérgio Conceição. Como é, afinal, trabalhar com ele?
-Nos três anos em que trabalhei com ele, ganhámos dois campeonatos, uma Taça e uma Supertaça. Por si só, isso mostra o nível da exigência com que ele trabalha. A partir do momento em que o Sérgio chegou, eu elevei os meus números na estatística, o meu número de jogos também, fazia quase 50 por época. É um treinador que exige muito psicologicamente e cada jogador tem de estar ciente da exigência e pressão de vestir a camisola do FC Porto. Ter essa exigência e pressão do treinador é bom e dá-nos o combustível para elevar o nível todos os dias. A partir desse momento em que os níveis estão lá em cima, acabamos por conseguir troféus e títulos.
Quanto teria valido o Alex Telles sem a influência da pandemia no mercado de transferências?
-Não sei dizer. Vou deixar essa resposta para quem entende de números. Prefiro não responder.
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"Dei por mim a ver vídeos do aeroporto"
Quatro troféus, vários momentos marcantes e outros arrepiantes. Altura para Alex Telles escolher os principais e confessar que ainda hoje revê alguns.
Qual foi o melhor momento que viveu no FC Porto?
-Há três que me vêm à cabeça. A vitória na Luz com golo do Herrera. Foi um momento espetacular. Davam-nos como derrotados e esse foi um momento de uma reviravolta tremenda. O penálti contra a Roma, que foi dos mais pesados e decisivos da minha carreira, deu tudo certo; e outro particularmente bom para mim, que foi o golo ao Portimonense, jogo atípico, com muitas paragens, muita confusão... Fazer um golo bonito daqueles a valer a liderança... são os momentos que acabo por nomear. Os títulos são muito importantes, mas os momentos particulares também.
E o momento que mais o arrepiou? Houve a festa do primeiro título no Dragão, os Aliados, o aeroporto após regressar da Madeira...
-Difícil escolher. Mas o que mais me arrepiou mesmo... Bem, os Aliados e a festa no Dragão arrepiam por inteiro, foi espetacular. Mas já estávamos preparados para isso, já sabíamos que haveria essa festa. No aeroporto foi muito especial. Quando chegámos, não sabíamos quantas pessoas haveria, arrepia muito mais. Há uns tempos até dei por mim a ver esses vídeos. Foi um momento de ligação entre jogadores e adeptos. Foi um grande momento.