"Jaime Pacheco era um treinador à parte, lutador. Muitas vezes não concordávamos"

Elpídio Silva, avançado que foi campeão pelo Boavista em 2001
A 18 de maio de 2001, há precisamente 20 anos, o Boavista quebrava a hegemonia dos chamados três grandes e conquistava, de forma surpreendente, o campeonato pela primeira vez. Elpídio Silva era uma das figuras dessa equipa e, a O JOGO, recorda o feito com saudade.
Que recordações guarda desse título conquistado há 20 anos?
-Foi um título muito desejado pelos jogadores, pela equipa técnica liderada pelo Jaime Pacheco, pela direção e pelos adeptos. É um titulo que fica para sempre na minha memória e de todos os boavisteiros. Estávamos no momento certo, na hora certa e no clube certo. Naquele ano tinha de dar certo, tínhamos de ser campeões. Foi um título que mudou muito a minha vida.
Como era trabalhar com Jaime Pacheco?
-Ela era um treinador à parte, um lutador, um batalhador. Muitas vezes eu não concordava com o tipo de trabalho que fazia, porque era exaustivo. Ele puxava muito pelos jogadores e, muitas vezes, quem não estava para jogar passava a titular. Às vezes acontecia ao contrário. Isso aconteceu comigo, sobretudo no início da época. Fui para o banco e tive muita dificuldade para voltar a ser titular. Mas foi sempre um grande treinador e valeu todo o e esforço que fizemos. No ano seguinte só não fomos novamente campeões por detalhes, porque em alguns jogos pensávamos que íamos ganhar facilmente. Foi um título ganho com muito sofrimento e muito trabalho.
Quais foram os jogos decisivos na caminhada para o título?
-Um dos jogos foi em Alverca. Ganhámos 2-1. Outro foi com o Beira-Mar, em Aveiro, onde marquei o golo mais bonito do campeonato, escolhido pelo Eusébio. Foi um golo muito, de cabeça. Não posso ainda esquecer o jogo de Paranhos, com o Salgueiros. Marquei três golos nesse jogo. Teve ainda um jogo em Guimarães, onde o Boavista não ganhava há muitos anos. Especial foi ainda a vitória com o Sporting, no Bessa, num lance em que eu subi, cabeceei e o Martelinho fez um golo espetacular. A partir desse jogo a nossa confiança aumentou muito. E no jogo com o Aves, que tínhamos de ganhar de qualquer maneira, marquei com a mão. Foi um lance muito rápido, a bola já estava a passar por mim e eu coloquei a mão na bola, bateu na minha cabeça e entrou. Se fosse hoje com o VAR, o golo teria sido anulado (risos).
"Imitámos um barco. Simbolizava um grupo unido, onde estavam todos dentro e a remar para o mesmo lado"
Em Alverca festejaram sentados no relvado como se estivessem a andar de barco. Qual era o significado?
-Imitámos um barco. Simbolizava um grupo unido, onde estavam todos dentro e a remar para o mesmo lado. Eu fazia sempre essas comemorações com o Duda, porque esse era o único momento, naquela época, em que nos divertíamos.
Lembra-se do apoio que a equipa teve nesse jogo em Alverca?
-Lembro, claro. Tivemos o apoio de milhares de adeptos e a maioria viajou em 50 autocarros. Foi impressionante. Essa apoio muito muito importante, porque íamos a defrontar um Alverca que tinha o Mantorras, que estava a atravessar uma fase muito boa. Se ele chutasse de fora do estádio marcava golo. Ele era incrível. Estudámos muito o Alverca. Marquei um golo e o Duda marcou o outro. Fizemos um jogo espetacular, mas nos últimos minutos sofremos muito.
Antes de assumirem a candidatura, a oito jornadas do fim do campeonato, já falavam no balneário nessa possibilidade?
-Sim, já falávamos entre nós. Acreditávamos que, estando concentrados e focados nos jogos, podíamos ser campeões. O João Loureiro assumiu a candidatura ao título na Madeira, depois do jogo com o Marítimo, mas entre nós já falávamos que íamos lutar pelo título.
"A nossa equipa era aguerrida e não deixava ninguém jogar, mas acho que os grandes relaxaram um pouco, sempre à espera que o Boavista caísse"
O Boavista foi campeão porque era a melhor equipa ou porque nos adversários pensavam que ia cair a qualquer momento?
-A nossa equipa era aguerrida e não deixava ninguém jogar, mas acho que os grandes relaxaram um pouco, sempre à espera que o Boavista caísse. Tínhamos um grupo muito bom e, quando um jogador saía, o outro entrava e dava conta do recado. Era um grupo muito unido.
Qual foi a sensação de festejar na Avenida dos Aliados?
-Lembro-me de ver um mar preto e branco. Foi um momento muito bonito na história do Boavista. Passámos a semana toda a festejar, relaxámos e perdemos daquele jeito com o FC Porto (4-1).
Na altura era conhecido pelo Pistoleiro. Essa alcunha continua?
-A maioria das pessoas que fala comigo ainda me chama Pistoleiro. Faço aqui alguns jogos e continuam a chamar-me da mesma forma, assim como quando falo com portugueses. Ficou essa alcunha e gosto, porque faz parte da minha história.
