Jornalista francês faz desfilar, no seu testemunho sobre Rui Pinto, o galarim de casos que, segundo ele, trouxeram "mais justiça aos cidadãos": processos de Ronaldo com o Fisco em Espanha, controlo de clubes, fraudes financeiras e corrupção nos processos de atribuição de competições a países
Corpo do artigo
"Rui Pinto é alguém que ama o futebol, descobre que o futebol é manipulado pela especulação financeira, em detrimento da paixão dos adeptos e dos jogadores", sublinhou o jornalista francês Edwy Plenel, do consórcio jornalístico Media Part, testemunha abonatória do denunciante, cujo julgamento no âmbito do processo Football Leaks prossegue no Campus da Justiça, em Lisboa.
Num testemunho extenso (cuja primeira parte pode ler aqui), e a propósito das denúncias trazidas a público pelo Football Leaks, destacou: "Em Espanha, os inquéritos sobre evasão fiscal em massa organizados por Jorge Mendes [empresário] foram [então] relançados. Levaram à condenação de muitos jogadores e treinadores, como Ronaldo e Mourinho, houve penas de prisão suspensas e multas de mais de vinte milhões de euros. Se não fossem os documentos do Football Leaks, o Estado espanhol nunca teria recuperado estes valores".
E recordou outro caso descoberto e julgado com base nas mesmas denúncias: "Na Suíça, falamos da independência da Justiça. Em 2018, os Media revelaram informações sobre um encontro secreto de Infantino com o procurador-geral suíço, o chefe da magistratura deste país. Um escândalo, o procurador teve que se demitir, um procurador especial foi nomeado, para inquirir sobre a relação entre Infantino e esse procurador-geral".
E desfiou nomes: "Ronaldo, Messi, Ozil, Pogba, Kanté... Houve evasão fiscal em massa, de jogadores como estes. Em cada caso, houve procedimentos para recuperar o dinheiro em nome do bem público".
A perguntas do advogado Francisco Teixeira da Mota, defesa de Rui Pinto, Edwy Plenel disse ainda: "O Football Leaks descobriu, igualmente, os métodos secretos dos agentes [empresários] para contornar as regulamentações e controlar os clubes, nomeadamente Jorge Mendes, através do Wolverhampton [Inglaterra], e Pini Zahavi com o Mouscron [Bélgica]. Um processo penal foi aberto na Bélgica a partir daqui".
Outra revelação, pelas palavras do jornalista francês, foi a corrupção das instâncias dirigentes do futebol - FIFA - com a Rússia, que deu origem a um processo interno, relacionado com doping, que acabou enterrado antes da Mundial na Rússia.
Segundo Plenel, o Football Leaks também permitiu "descobrir como a UEFA escondeu fraudes financeiras de clubes ricos e influentes como o Paris Saint-Germain, Manchester City, Mónaco e outros da Rússia, financiados por empresas estatais (...). Permitiu que se abrissem inquéritos sobre o presidente do PSG, Al Khelaifi, e sobre suspeitas de corrupção sobre a atribuição do Mundial 2022 no Catar".
"Resumindo, sem Football Leaks não teríamos nós, os cidadãos, a justiça, sabido de todas as manobras ilegais, fraudulentas que ocorrem no universo do desporto mais popular do mundo", rematou o jornalista francês. "Antes do Football Leaks", o futebol era um mundo mais opaco. Uma das consequências foi obrigar os órgãos que gerem o futebol a uma maior fiscalização e a mais transparência e ética sobre os clubes".
Rui Pinto, de 32 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, "devido à sua colaboração" com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu "sentido crítico", mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.