"Cresci a jogar na rua, entre raparigas e rapazes, com atletas mais velhos"

Irlanda Lopes, jogadora do Vitória
Irlanda Lopes, com 10 golos, tem-se destacado como uma das figuras do bom momento vitoriano
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O Vitória chegou esta época à Liga BPI e tem surpreendido tudo e todos. A equipa de Guimarães, que soma quatro vitórias e um empate nos últimos cinco jogos, está atualmente instalada no quarto lugar, um registo pouco comum para quem acabou de subir de divisão. Entre as caras deste bom momento está Irlanda Lopes, avançado de 29 anos e internacional por Cabo Verde. Com 10 jogos e dois golos, Irlanda tem sido uma peça importante na forma como o Vitória se tem estabilizado na elite. Em conversa com O JOGO, a avançado fala sobre o crescimento da equipa, a evolução individual, a ligação ao futebol e o sonho de representar Cabo Verde em grandes competições.
A equipa atravessa a melhor fase da época, com quatro vitórias e um empate nos últimos cinco jogos. O que está por detrás deste crescimento tão consistente?
-Esta fase positiva é fruto do crescimento natural do grupo. Estamos mais confiantes, mais maduras e a executar melhor o que trabalhamos durante a semana. Encontramos um equilíbrio entre trabalho, identidade de jogo e espírito coletivo, e isso tem sido decisivo para a consistência dos resultados.
Na estreia do Vitória na Liga BPI, como avalia o percurso da equipa até agora?
-Tem sido uma época de muita aprendizagem e evolução. Sabíamos desde o início que a Liga BPI exigiria mais intensidade, mais responsabilidade e um nível competitivo muito elevado. Apesar das dificuldades normais de uma equipa que chega pela primeira vez à primeira divisão, temos mostrado caráter, união e uma enorme vontade de crescer. Sinto que estamos a construir bases sólidas para terminar a época de forma consistente. Individual e coletivamente, estamos a dar passos seguros, sempre com humildade e ambição.
O Vitória ocupa atualmente o quarto lugar da Liga BPI. Até onde pode chegar?
-O nosso primeiro objetivo é garantir a manutenção. Depois disso, queremos continuar a trabalhar com ambição, rigor e consistência, para ir sempre um pouco mais longe. A Liga BPI é extremamente competitiva, mas acreditamos no nosso processo e na evolução que temos mostrado jogo após jogo.
Este arranque surpreendeu muitos que não esperavam ver o Vitória tão bem posicionado. Sente isso dentro do grupo?
-Nós não jogamos para surpreender ninguém. O nosso foco é honrar o Vitória e dar alegrias aos adeptos. Preparamos cada jogo com seriedade e compromisso, e é isso que nos move: respeitar o clube e trabalhar para o engrandece-lo. O que se vê na tabela é o reflexo da dedicação diária e da confiança que existe dentro do balneário.
No plano individual, a Irlanda soma 10 jogos e dois golos. Como vê o seu rendimento até agora?
-Sinto que o meu rendimento reflete o trabalho diário. Os números contam, claro, mas valorizo sobretudo tudo o que ajuda a equipa a ser mais competitiva. Procuro evoluir em cada treino, corrigir pormenores e manter uma postura consistente em campo. O meu foco é ser útil, responder às exigências da Liga BPI e continuar a estar no melhor nível para ajudar o Vitória.
Enquanto futebolista cabo-verdiana, o que significa para si afirmar-se numa liga cada vez mais competitiva como a portuguesa?
-Significa muito mais do que evolução individual. É um orgulho profundo e uma responsabilidade enorme. Cada passo que dou carrega a força das minhas raízes, da minha ilha do Fogo e de todas as jovens cabo-verdianas que sonham chegar mais longe.
A sua carreira passou por várias mudanças e desafios. Que momento considera mais determinante neste percurso?
-A mudança para Portugal foi, sem dúvida, o momento mais marcante. Apesar da ligação histórica entre os dois países, adaptar-me a uma nova realidade, novos hábitos, novas rotinas e a um ritmo competitivo diferente exigiu muito de mim, como atleta e como pessoa. E tudo isto coincidiu com a perda da minha mãe, um dos pilares mais fortes da minha vida. Enfrentar essa dor longe de casa tornou o caminho mais duro, mas também me fortaleceu. Fez-me acreditar ainda mais no meu propósito e na escolha que fiz.
Que impacto tem o futebol na sua vida?
-O futebol tem um impacto enorme na minha vida pessoal. Desde pequena que estou ligada ao desporto e sempre encontrei nele disciplina, expressão e superação. O meu pai é uma das minhas maiores referências e com ele aprendi que vencer não é apenas um resultado, é uma mentalidade que faz parte da nossa cultura. Cresci a jogar na rua, entre raparigas e rapazes, muitas vezes com atletas mais velhos. Esses momentos ensinaram-me a competir, a partilhar, a resistir e a acreditar.
"Representar o meu país é um objetivo que carrego todos os dias"
Quando questionada sobre o sonho de representar Cabo Verde com mais regularidade e disputar grandes competições internacionais, Irlanda Lopes não esconde a avidez. "Faço parte de uma história muito bonita que Cabo Verde está a construir no futebol, tanto no feminino como no masculino. Estamos a caminho da nossa primeira CAN, a maior competição africana, e vivemos também o orgulho de ver a seleção masculina alcançar o primeiro Mundial. Representar o meu país de forma mais constante é um objetivo que carrego todos os dias. Acredito profundamente que posso contribuir para esta nova fase e, quem sabe, chegar a disputar um Mundial no futebol feminino. Seria, sem dúvida, a maior honra da minha carreira e da minha vida", admite.
