Preocupado com os perigos da inatividade física, André Seabra criou o conceito de futebol como "medicamento" para estimular a prática de exercício. O conceito nasceu da criatividade do investigador da Faculdade de Desporto, da Universidade do Porto, em parceria com a de Medicina, Farmácia, Psicologia e FPF
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Preocupado com os perigos da inatividade física, André Seabra criou o conceito de futebol como "medicamento" para estimular a prática de exercício. A FPF gostou da ideia, apadrinhou-a com apoio logístico e financeiro, e da UEFA veio mais ajuda para a campanha.
Qual é o princípio ativo deste "medicamento"?
É o futebol, por várias razões: por ser o desporto mais popular e praticado no mundo; o que, à partida, para todos os medicamentos e estratégias, que entendemos ser de saúde pública, vai ao encontro dos interesses e motivações das populações. Este "medicamento" tem algumas vantagens em relação aos farmacológicos: é um desporto acessível a todas as crianças, adolescentes e adultos, independente do estatuto socioeconómico, e é um desporto simples, sem exigir grandes recursos e espaços. Porque é um "medicamento" com regras muito simples e muito usado há 20 e 30 anos, em que as crianças brincavam na rua; a outra razão, a fundamental, as exigências que o jogo de futebol coloca respondem às linhas de recomendação da OMS.
As crianças não costumam reagir bem à palavra medicamento, pensam num xarope de gosto desagradável...
É verdade, isso tem de facto acontecido, pois as crianças perguntam "esse medicamento o que é e o que contém essa caixa?" Eu brinco, dizendo-lhes que é um "medicamento" que lhes vai dar mais qualidade de vida e saúde e melhorar a autoestima. Digo-lhes que dentro da caixa está futebol em pó, e que deve ser tomado com muitos amigos, com o teu pai e a tua mãe, em qualquer sítio. E ficam a olhar para mim incrédulas.
Isto ajuda a criança face ao bullying?
Acreditamos que sim. Porque este "medicamento" tem sido muito trabalhado com crianças obesas, muitas delas sofrem desse problema. Quando tentam envolver-se numa prática desportiva, normalmente, são apartados do grupo e são colocados na baliza. O bullying nestes casos é permanente e sentimos que estamos perante algo que as ajudará a superar esse problema. Aqui não há guarda-redes para anular esse estigma e para evitar o que nós não queremos: as paragens durante o jogo. Queremos uma criança contente e com vontade de voltar na próxima sessão.
Não tem efeitos secundários?
O efeito secundário é "ficar apaixonado pelo futebol". Quem toma este "medicamento" em criança será, no futuro, um adulto praticante de qualquer atividade desportiva. E deve ser tomado três dias por semana. As nossas crianças, infelizmente, passam oito a dez horas na escola quase sempre sentados, sem gastar energia.
Sendo em pó, é mais fácil de tomar?
Sim. O pó é a metáfora para o jogo. Além disso, há a sugestão de que os medicamentos solúveis são mais agradáveis.
Quando fala em saúde pública, vem à cabeça uma qualquer situação epidémica...
Temos uma pandemia! A inatividade física é um grave problema à escala mundial e um dos fatores que conduz à obesidade. A função da investigação na nossa faculdade é promover hábitos mais ativos. Este "medicamento" é uma estratégia para aumentar a atividade física e alertar os autoridades deste país.