São dois os portugueses que vão competir nos Jogos Olímpicos de Inverno, que arrancam a 9 de fevereiro em PyeongChang, na Coreia do Sul. Arthur Hanse é repetente, mas Kequyen Lam estreia-se para cumprir o sonho de uma vida
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Arthur Hanse tem 24 anos e nasceu em Paris; Kequyen Lam tem 38 anos e nasceu em Macau. São eles os atletas que vão representar Portugal na Coreia do Sul, nos Jogos Olímpicos de Inverno, numa delegação mais experiente que há quatro anos, em Sochi. "Esta foi a primeira vez conseguimos preparar uma Missão. Em Sochi foram os atletas que competiam por sua conta e se qualificaram. Agora fizemos um programa que começou em junho de 2017. Foi curto, ainda assim, mas esperamos que no próximo ciclo olímpico seja melhor", destaca Pedro Farromba, presidente da Federação de Desportos de Inverno de Portugal, que será Chefe de Missão em PyeongChang.
Arthur, que compete em slalom e slalom gigante, repete a experiência, depois de já ter estado na Rússia, em 2014. Estudante, está há nove meses dedicado a cem por cento à neve e agora totalmente focado nos Jogos. "É o mais importante para mim, neste momento. Tenho participado em Taças do Mundo e da Europa, mas os Jogos Olímpicos são o sonho de qualquer atleta. Representar um país com valores olímpicos é muito importante para mim." O luso-francês recusa o nervosismo antes do tempo e reconhece que a experiência ganha em quatro anos pode fazer a diferença no resultado. Em 2014 não conseguiu classificar-se nas provas em que competiu, mas agora pensa poder fazer melhor. "Foi a minha primeira competição e experiência olímpica. Agora quero fazer melhor, claro. Trabalhei durante quatro anos e conheço-me melhor", revelou em declarações a O JOGO.
Agradecer e retribuir
Foi em 2006 que Kequyen Lam conseguiu a nacionalidade portuguesa, 25 anos depois de ter nascido em Macau, colónia portuguesa até 1999. Os pais, chineses, viviam no Vietname, mas a guerra deixou-os sem futuro e embarcaram sem rumo. O navio levou-os a Macau e por ali ficaram, num campo de refugiados, um ano. Entretanto, nasceu Kequyen que, porém, ficou pouco tempo em Macau. Atualmente, vive no Canadá e é por lá que se prepara para mostrar o que os atletas portugueses podem fazer na neve. "Quando obtive a nacionalidade portuguesa vi isso como um sinal, uma oportunidade de fazer parte de algo maior do que eu, de competir por uma nação sem tradições de desportos de inverno. Quero ajudar a espalhar a imagem de Portugal nos desportos de inverno. Tenho muito orgulho por usar a bandeira portuguesa. Foi Portugal que acolheu os meus pais num momento difícil e agradeço por isso." Farmacêutico de profissão, passou por Portugal há 12 anos e por cá ficou dois meses a conhecer, de Norte a Sul, o país a que também pertence. "Aprendi a língua e cheguei até a trabalhar numa farmácia, em Peniche. Ajudou-me a ganhar laços com a cultura portuguesa."
Kequyen chega aos Jogos Olímpicos para competir na distância de cross country, uma prova de resistência de 15 quilómetros. Será o realizar de um sonho que, no entanto, era para ser cumprido noutra disciplina. "Estar nos Jogos é um objetivo de vida desde que, em 1998, vi o canadiano Ross Rebagliati ganhar o primeiro ouro em Snowboard em Okinawa. Disse logo que queria tornar-me desportista olímpico. Demorei 20 anos, mas consegui. Fiz snowboard desde os 16 anos e, já com a bandeira portuguesa, tinha como objetivo estar em Sochi, mas em 2013, na Áustria, tive um acidente e parti o ombro. Falhei cinco etapas e não consegui o passaporte para a Rússia. Só depois disso, em 2015, pensei no cross country." A sugestão tinha partido anos antes da parte de Danny Silva, que representou Portugal nos Jogos de 2010, em Vancouver, precisamente nessa modalidade. "No snowboard já não estava confiante e quando temos medo em saltos a 80 km/h é mais provável que façamos um erro. Tentei então o cross, um desporto completamente diferente, mas que me deu novamente um objetivo: vamos ver se será possível", lembra Kequyen.
Futuro risonho
Com 38 anos, confessa que não está nervoso e que esse sentimento só chegará mesmo na Coreia, algo que considera normal. O resultado, esse, depende dele próprio. "Quero esquiar bem, depressa, dentro das minhas capacidades. Não consigo prever um resultado, mas se esquiar bem vou estar feliz com o resultado, seja qual for." Quanto ao futuro, já tem algo em mente. "Quero deixar um impacto num país que não é conhecido pelos desportos de inverno. Agora que alcancei este objetivo, quero promover o desporto. Há grande comunidade portuguesa em Vancouver e estou a tentar encontrar portugueses, jovens, que queiram praticar desportos de inverno. Se encontrar um já terei deixado um legado para Portugal. Nos próximos Jogos, em 2022, Portugal vai estar ainda mais representado. Agora somos dois, mas com a mensagem a espalhar-se, podemos ser mais daqui a quatro anos."
A mesma ideia é defendida por Pedro Farromba, que lembra o trabalho que está a ser feito por todo o mundo. "É muito difícil desenvolver um atleta em Portugal. Não temos dias de neve diferentes. Mas se virmos onde treinam os melhores atletas portugueses de ténis, natação, futebol, a maioria estão lá fora. Quase arrisco dizer que Ronaldo em Portugal não seria o melhor do mundo. Estes atletas necessitam de muitos dias de neve, à volta de 200 e nós, aqui, teremos, num ano bom, 50 ou 80 dias. Estamos, desde 2014, à procura de atletas nas comunidades portuguesas e temos vários referenciados, bastante novos. Acredito que no futuro vamos poder ter mais atletas e mais modalidades e com resultados bastante atrativos."
Um dos momentos altos de qualquer evento dos Jogos Olímpicos é a cerimónia de abertura. Arthur Hanse foi porta-estandarte em 2014 e confessa que é um momento que nunca esquecerá. "Foi extraordinário. Senti realmente o que era representar um país. Eu era um país, era parte da minha família. Estou a pensar nisso neste momento e até sinto arrepios. Espero poder levar a bandeira novamente."
Dupla ficou com sonho nas mãos
Hugo Alves, no luge, e Christian de Oliveira, em snowboard, foram os outros dois portugueses que ficaram perto dos Jogos, mas que acabaram por não conseguir qualificar-se. A viver no Japão desde 2012, Hugo Alves, professor de 36 anos, viu um acidente reduzir-lhe as hipótese de chegar à Coreia. "Tive um acidente na pista olímpica, parti duas costelas e lesionei-me na coluna. Fiquei muito tempo parado e acabei por não conseguir pontos para estes Jogos."
Christian, de 18 anos, vive em Melbourne, na Austrália, e é filho de pai português. Não vai estar na Coreia, mas não esconde a ambição para o futuro. "Espero ser campeão do mundo e ganhar uma medalha olímpica nos próximos Jogos Olímpicos, em 2022 ou 2026."