Portugueses

Milagre português na Alemanha e uma carreira ao jeito do "Money Ball"

Carlos Leal trabalha no Arminia, do segundo escalão alemão

Carlos Leal entrou no futebol real pela amizade com Félix Magath, mas nunca deixou de assessorar comentadores com dados que em televisão valiam ouro. Agora aplica-os na formação de planteis.

Natural de Sortelha, aldeia de Sabugal (Guarda), Carlos Leal emigrou para a Alemanha em 1974 e estudou "Geografia económica".

Em 1992 começou a trabalhar numa empresa de análise de futebol com dados, a que hoje em dia se chama... estatística. "Hoje é o dia a dia, na altura era histórico. Foi a primeira empresa que catalogou dados de equipas e jogadores para além dos resultados, marcadores ou cartões e cantos. Fui o segundo scout de dados da Alemanha e ia a vários estádios. Estávamos numa fase em que todos procuravam o ouro e a estatística era ouro. A televisão queria fazer uma peça sobre um jogador e encomendava dados sobre ele. A minha ligação ao futebol começou assim", diz, num português perfeito, fomentado "por falar sempre em casa dos meus pais e pelas quatro/cinco viagens por ano a Portugal para ver oito/nove jogos".

A partir de 1999 começou a trabalhar mais de perto com a Imprensa. "A estatística acrescentava valor. Mudei-me para Munique. Basicamente dava informação a comentadores, ex-jogadores ou treinadores, para que parecesse que eles conheciam a equipa que estavam a comentar. Trabalhei com Matthaus, Beckenbauer e, mais recentemente, a partir de 2010, com Óliver Khan", relata.

A gestão desportiva começou, no entanto, com Félix Magath. "Alguns diretores de clubes já me ligavam quando tinham interesse em jogadores portugueses. Em 2007 estreitei a relação com Magath, que foi para o Wolfsburgo. O clube deu-lhe muito dinheiro e ele precisava de muitos novos jogadores. Ele ativou-me para ajudar na procura, na avaliação e até na tradução porque tinha muitos jogadores brasileiros. Teve o Ricardo Costa e estive a ajudá-lo no estágio. Não foi um início formal, porque ainda trabalhava com as televisões, mas na prática sim. Em 2013, o 1860 Munique resolveu montar uma secção de scouting e eu fui a opção. Não foi um passo fácil, mas aceitei. Estive até 2016. O clube é caótico, mas incrível nos aspetos emocionais. Ia só montar o departamento de scouting, mas no meu primeiro dia de trabalho, a minha primeira tarefa foi pensar num novo treinador. Foi o caos absoluto, mas nesses três anos aprende-se mais do que em 15 anos num clube sólido", brinca.

Nesse clube aplicou o método "money ball", conhecido num filme que Brad Pitt protagonizou e onde este representa um especialista em estatística que monta um plantel de baseball mais barato do que os demais. "Foi por isso que o Munique 1860 me procurou. Queriam um especialista de dados com ligação ao futebol real", confirma.

Seguiu-se o Arminia. "O diretor desportivo mais jovem do país, Samir Arabi, um dos melhores, ligou-me. Tinha uma equipa velha e dívidas históricas. Samir e eu mandamos no futebol do clube. A dívida de 28 milhões de euros chegou a zero em dois anos e fizemos um plantel esta época que estava avaliado em 15 milhões pelo Transfermarkt. O Estugarda valia 80 milhões e o Hamburgo 50... Temos sete pontos de vantagem e só pensávamos em atacar o terceiro lugar. EStá a correr bem", sorri. Continua a aplicar a fórmula "money ball"? "Sim, continuo a usar muito os números, mas isso já não é tão decisivo. A Impressão visual e real do jogador é o mais importante, mas os dados ajudam muito até à decisão final. A minha vida foram os dados, mas talvez já não seja tão fanático ", resume. "Hoje, se for possível receber informações do roupeiro, ótimo", conclui. O Arminia não está na I Liga há mais de 10 anos.

André Morais