FC Porto

"Melhor contratação do Liverpool" revela: "FC Porto de Mourinho fez-me treinador"

Vítor Matos trocou o FC Porto pelo Liverpool Fábio Poço/Global Imagens

ENTREVISTA (PARTE 1) - "A melhor contratação do Liverpool" foi um treinador português, de 31 anos e com passado no FC Porto. Klopp desfez-se em elogios e O JOGO foi conhecer o técnico que, aos 15 anos, se sentiu inspirado.

Vítor Matos tem quase dez anos de trabalho em Portugal, mas a sua fama chegou ao nosso país via Jurgen Klopp. "Pensámos que fazia sentido ter alguém no papel que era do Pepijn Lijnders. É um treinador fantástico, experiente e jovem. Está habituado a ter seis ou sete treinos por dia. É inteligente, fala bem inglês e aprendeu no FC Porto, o que é bom para nós", considerou o alemão, que se juntou ao coro de Pepijn, que falou dele como "a melhor contratação do Liverpool".

Mas, afinal, quem é Vítor Matos? O JOGO foi conhecê-lo.

O que tem o Vítor Matos de tão especial que mereça elogios tão grandes de Klopp e Lijnders?

-[Sorri e pensa] Acima de tudo, é para mim um prazer e um orgulho enorme trabalhar novamente com Pepijn Lijnders, num clube como o Liverpool e com um treinador como Klopp. Mais do que procurar elogios como esse, sempre gratificantes de ouvir, procuro apresentar o meu trabalho, apresentar algo que faça sentido para todos no clube e que vá ao encontro do que se pretende: o desenvolvimento dos jogadores mais talentosos do clube, dos jogadores de elite do clube.

Foi para Liverpool para criar algo semelhante ao "Potencial Jogador de Elite" que Pepijn desenvolveu no FC Porto?

- Não é um departamento. É uma função mais específica que o clube sentiu necessidade de criar na equipa técnica, escolhendo alguém com experiência no futebol de formação e também numa liga profissional, que também tivesse conhecimento nesta função mais específica. Daí surgiu a oportunidade. Tenho uma preocupação especial como o desenvolvimento dos jogadores mais jovens da equipa. O plantel foi estruturado para não ser extenso e permitir que os talentos tenham espaço. E isso leva a que haja a preocupação de desenvolver e trabalhar os mais jovens. Mas esses trabalhos decorrem nos treinos da equipa principal e dos sub-23.

Conheceu Pepijn Lijnders no FC Porto. Foi identificação imediata?

-Sim. O "Pep" acredita que só se aprimora o desenvolvimento individual se, ao mesmo tempo, o jogador continuar a perceber o desenvolvimento coletivo. Eu também. O "Pep" é uma pessoa fantástica, do melhor que há em diferentes tipos de questões.

Vamos recuar ao início. Como nasce a ligação do Vítor Matos ao futebol?

-Sempre tive uma paixão grande pelo futebol. Joguei no Coimbrões e no Valadares. Tive a felicidade de assistir a um grande momento do FC Porto, em 2002/03 e 2003/04, e fiquei impressionado com a forma como a equipa jogava, como foi construída, como conseguiu ser aquilo tudo naquela época. Isso despertou em mim a curiosidade de saber o que estava por trás, saber como as coisas aconteceram e, consequentemente, a vontade de ser treinador. Foi esse o momento. Com 15 anos já tinha isso na minha cabeça. Continuei a jogar até ao primeiro ano de sénior, fui para a Faculdade de Desporto, fui estudar para a Holanda e, quando regressei, recebi o convite para treinar. E assim comecei.

Nunca hesitou?

-Não, não [risos]. Como jogador, a minha cabeça procurava fazer coisas, mas as pernas não deixavam. Foi natural.

Voltando ao seu percurso...

-Eu acredito muito nas vivências e na forma como estas nos preparam. Na faculdade houve dois professores com grande impacto em mim: Vítor Frade e Paulo Cunha e Silva, que nos obrigavam a pensar sobre a vida. Este tipo de coisas fascinou-me, teve impacto em mim. No fim da faculdade, surge a oportunidade de treinar o Trofense [sub-16]. Mantive a ligação com o Prof. Vítor Frade e no meu segundo ano de Trofense surge a possibilidade de uma entrevista com Luís Castro. Ele apresentou-me a ideia para a formação naquele momento, fez-me um conjunto de questões e passado algum tempo telefonou-me a convidar para algumas funções. Chego para treinar os sub-9 e ser adjunto dos sub-13. António Folha foi o primeiro treinador de quem fui adjunto. Foram sete épocas em várias funções. Marcou-me muito. [Ver experiência no FC Porto na terceira página desta entrevista].

"CADA TREINO COM KLOPP É UMA 'MASTERCLASS'"

Está encantado com Anfield e e um ambiente "capaz de fazer a equipa sentir força em todos os momentos", mas é em Melwood [centro de treinos] que trabalha todos os dias. Uma espécie de doutoramento em futebol.

O que faz do Liverpool um clube tão especial?

- Adoro clubes com presença e identidade fortes. O FC Porto é esse tipo de clube, o Liverpool também. É o tipo de clube que se sente na rua, nas pessoas, no táxi... Ao mesmo tempo, é um clube caloroso, com ambiente familiar, em que toda a gente dá 200% para que os jogadores se possam superar todos os dias. Quando cheguei, todos se preocuparam com que me sentisse em casa.

E depois há Anfield...

- É fantástico. Já conhecia. A ligação entre adeptos, treinador e jogadores é tremenda e uma coisa que tem muita força, capaz de a equipa sentir em qualquer momento do jogo.

Como é a relação com Jurgen Klopp. O treinador é tão louco como parece?

- É uma pessoa fantástica, um ser humano incrível. O carácter dele está em todas as pequenas coisas, seja no treino, no jogo, na palestra ou numa conversa. Tem o dom de chegar ao coração de cada um e exigir o máximo. É quase como se eu, em cada sessão de treino, tivesse uma "masterclass" [aula dada por um especialista com saber notório]. A consistência e a fluidez da ideia de jogo que ele tem, a forma como procura ser competente a defender, a transitar, a procurar a verticalidade ou os espaços, a variabilidade em termos de finalização, este gosto por atacar, voltar a atacar e voltar a atacar... Isso dá muito trabalho e ele conseguiu construir. Recebeu-me de braços superabertos e com uma alegria enorme.

O processo de trabalho e o método que utiliza são exclusivamente seus ou obedecem a critérios de Jurgen Klopp?

- Tudo terá de fazer parte do que é a ideia do treinador principal. Só faz sentido estar se eu entender a sua ideia de jogo, a sua forma de jogar e treinar. Mas ele colocou-me extremamente à vontade desde o primeiro momento para criar, procurar as melhores soluções para trabalhar o grupo de jogadores com mais talento.

E as estrelas do Liverpool, como são?

- Muito acessíveis. O grupo é fantástico, nunca se queixa, não tem momentos de desconcentração. É um grupo que pela relação deles e pelo coletivo construído e identidade, é forte pelo coletivo, respeitando a individualidade de cada um. Mentalidade tremenda.

Imagino que tenha a ambição de trabalhar como técnico principal na elite... Orientou a carreira nesse sentido?

- Neste momento a minha preocupação é o Liverpool e a forma como posso ajudar nas funções que desempenho. Estou muito motivado e contente. Mas nunca sabemos o que vem a seguir. Se irá acontecer? Acredito que sim. Não sei quando será, mas não é isso que me preocupa. O que me alimenta todos os dias é acordar, ir para o centro de treinos do Liverpool e trabalhar com tantas pessoas incríveis.

Onde se imagina daqui a dez anos?

- Onde me sinta bem e onde as pessoas me queiram. Se tiver de ser no Liverpool, perfeito; se for noutro sítio, perfeito também. Quero é que as coisas façam sentido para mim, para a minha família e para o clube.

André Morais