O choque seletivo da classe política
Quando Bruno de Carvalho pôs deliberadamente jornalistas em perigo, a indignação tirava votos
Algumas das reações públicas ao ataque a Alcochete têm um lado patético, em particular as que derivam da política. O lado patético, para começar, vem das súbitas indignações para com o presidente do Sporting por ter, de alguma forma, motivado as agressões aos jogadores da sua própria equipa. Não sei se motivou ou não. Mas sei que, em fevereiro, pôs deliberadamente em risco a pele dos jornalistas (a mesma criatura permeável às barras de ferro, com gémeos menos desenvolvidos) que cobriam uma assembleia geral e nenhum político reparou nisso, como não reparou nos excessos e indignidades que Bruno de Carvalho foi cometendo com regularidade suíça. Depois, até o convidaram para a Assembleia da República. A diferença está num ponto bem claro: defender os jogadores nesta situação é fácil e traz simpatias; defender os jornalistas em fevereiro hostilizava eleitores. No entanto, teria sido bom que, durante estes cinco anos, algum político tivesse sacrificado uns milhares de votos na tentativa de abrir os olhos aos sportinguistas, em vez de se refugiarem nas generalizações inúteis sobre "o estado do futebol", "o clima" e "os diretores de comunicação". A outra parte do lado patético das reações é a condenação da FPF e da Liga. Os mesmos fulanos que se sentaram a almoçar com Bruno de Carvalho depois do episódio de fevereiro; que ignoram alegremente as palhaçadas do Instituto do Desporto; que não sabiam, por exemplo, que, por causa deles, a polícia não tem forma de verificar se os adeptos banidos ficam em casa - são essas pessoas que querem a FPF e a Liga a prevenir crimes em vez do Estado?
Nota: isto não significa que os clubes façam o mínimo. No caso do Sporting, correr com a claque Juve Leo do estádio, evidentemente.