Futebol sem marketing, hinos, novas ideias e esclarecimentos

Futebol sem marketing, hinos, novas ideias e esclarecimentos

CONTRA-GOLPE - Um artigo de opinião de João Araújo.

Morreu Jô Soares, esse nome grande, referência do humor aquém e além mar, e logo Marcelo Rebelo de Sousa lamenta o desaparecimento, como se do "carimbo" da comunicação presidencial dependesse a exata dimensão do acontecimento; a PSP emite um comunicado a lembrar que há 244 indivíduos impedidos de aceder a recintos desportivos e que prestará particular atenção às medidas de interdição, ao mesmo tempo que garante o "empenhamento dos polícias nos 238 jogos da I Liga", e sentimo-nos seguros porque, através dessa comunicação, os agentes da lei e da ordem garantem cumprir o trabalho deles. E pensamos como, mais até do que ser ou parecer, tudo se resume a comunicação. Ou assim aparenta.

A Liga anuncia a criação de um hino, os representantes de classe do futebol profissional clamam por mais tempo útil de jogo, há novas recomendações na arbitragem. Menos tolerância, mais ação, é a palavra de ordem para os árbitros, supostamente investidos de novos poderes (e de reciclada qualidade/capacidade?) e isso faz temer pela criteriosa utilização dos mesmos. No inconsciente forma-se, voltando à polícia, a imagem do agente de shotgun apontada a adeptos no estádio de Guimarães...

Tudo em nome do espetáculo - dizem-nos -, estas novas iniciativas e medidas. Espetáculo? Holofotes coloridos, confetis e árbitros com comichão no dedo do gatilho da shotgun apontada aos bancos? Hinos, marketing, promessas de ideias refrescantes e capazes de captar novos adeptos para o negócio, perdão, para o jogo? Espetáculo? Espetáculo é ganhar, diria um treinador, preocupado em fazer tudo para cumprir o que é exigido a ele e aos jogadores, o objetivo último de qualquer jogo, a única coisa que interessa. Ganhar, lutar por isso! Mesmo que se perca ou empate.

Faulkner diz-nos que o passado nunca passa realmente, é uma dimensão do presente, ou seja, o que vivemos antes está naquilo que fazemos e decidimos a cada momento. Ao futebol talvez fizesse bem não esquecer a essência do seu espetáculo, que não é a parafernália, nem cosmética, nem medidas que confundem em vez de esclarecer (porque há coisas impossíveis de pôr nas leis, como o entendimento do jogo), mas sim querer ganhar e os adeptos desfrutarem com isso. Arrancou ontem a Premier League inglesa e o empate do recém-promovido Fulham com o vice-campeão Liverpool traz-nos à memória essa frase batida, querer ganhar e oferecer o verdadeiro espetáculo aos adeptos.

Quem sabe não será precisa tanta criatividade e tempo de antena a tentar captar novos nichos de mercado, perdão, adeptos e a tentar desbravar futuros imaginados para o futebol a partir dos interesses dos clubes e demais "partners" e "stakeholders". O futebol chegou até aqui como desporto-rei porque sempre foi o jogo mais simples do mundo. Talvez tudo se resuma a entender e respeitar a sua essência, o adepto e suas expectativas.