PLANETA DO FUTEBOL - Um espaço de opinião da autoria de Luís Freitas Lobo.
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1 Confesso que não senti nada. O futebol, sensorialmente falando, não voltou. Surgiu outra variante do jogo. Não adianta mentir, vendo os jogos da regressada Bundesliga, não consegui, por mais esforço que tivesse feito, sentir alguma coisa. Não fosse a necessidade urgente que todos sentimos do futebol como atividade económica voltar, o melhor seria mesmo não jogar. Porque tudo o que se cria nesta fase surreal à volta do jogo, é o oposto de tudo o que é o futebol. A negação da sua emoção, ambiente, sons, gestos. É impossível, porém, travar completamente, por regulamento, a natureza.
2 Há semanas, sobre o distanciamento físico-social, perguntei, "quanto vale um abraço"? Vendo estes disfuncionais jogos da Bundesliga, a pergunta mudou. Foi quando, após um golo, o alemão Max Mittelstadt correu para o festejar com o seu autor, o bósnio Ibisevic, e, chegando perto dele, abraçou-o e deu-lhe um beijo. Carícias rápidas, é certo, mas feitas. Todos, no grupo, ficaram admirados, com sorriso assustado mas, ao mesmo tempo, de liberdade.
Mais do que o golo de Haaland ou os dois de Guerreiro, estava eleito o momento emocional da jornada, aquele que, por fim, fez-me sentir que estava a ver um jogo de futebol (o outro gesto falado de Boyata não fora um beijo, mas sim um segredo tático ao ouvido).
O valor dum beijo atinge, assim, a cotação máxima. Para além do abraço, que pode ser simulado com o tocar dos cotovelos, só ele teve o valor e força para nos verdadeiramente devolver a vida e o futebol. Ao mesmo tempo. Nem me lembro do golo, sinceramente.
3 Os restos dos festejos fizeram as devidas vénias ao vírus. A bola desinfetada, mascaras no banco, ausência de adeptos, tudo foi cumprido.
No meio do silêncio, ouviu-se o insulto de Todibo a Haaland, fazendo referência à sua avó. A eterna luta entre central e ponta-de-lança é assim mesmo. Agarraram-se mutuamente nos cantos (o vírus não distingue marcação individual ou à zona) e trataram-se como habitual. A diferença foi apenas de, no silêncio ensurdecedor, todos os sons do futebol no campo se ouvirem no vácuo das bancadas vazias. As mesmas em direção às quais os jogadores do Borussia fizeram no fim o festejo habitual como se o mítico muro amarelo lá estivesse.
Não será esta a nova normalidade. É demasiado contranatura. Os festejos de rebeldia (com causa) irão surgir cada vez mais jogo após jogo. Do inconsciente ao consciente.
Como o beijar pelo qual tanto ansiamos num primeiro encontro. Esse momento pode tardar, mas, sabemos todos, aparece sempre. Basta querer e perceber quanto vale um beijo. Mesmo que "roubado" (como o de Mittelstadt a Ibisevic).
Existem mesmo "adeptos táticos"?
É irónico que o último golo apontado no nosso campeonato antes da paragem, tenha motivado aqui o comentário de que ele fora muito marcado por, nesse momento, essa equipa estar a atacar para uma baliza que tinha atrás dela uma legião de adeptos seus enlouquecidos que como sugavam a bola. Essa equipa e adeptos eram do V. Guimarães (na Mata Real contra o Paços de Ferreira) e o autor do golo, um criativo João Carlos Teixeira que entrara ao intervalo e dera assim a volta ao resultado (de 1-0 para 1-2).
Ambos os fatores tinham feito a diferença (o apoio e o criativo) mas, sinceramente, vendo como funciona a cabeça das equipas vimaranenses e seus jogadores, penso que foi mais o atacar com os adeptos olhando-os nos olhos (apoiando e exigindo o máximo) que fez com que todo o onze se superar mudando totalmente de atitude em relação à sonolenta primeira parte
Para este final de campeonato, só poderão agora contar com o fator tático (Ivo Vieira compor melhor o meio-campo de início) e técnico (o jogador mostrar qualidade mesmo sem essa turba de apoio a sugá-lo). Arrisco dizer que de todas equipas que jogarão de bancadas vazias, a que ficará mais incompleta é esta do Vitória. Faltarão os "adeptos táticos" atrás das baliza.
Modelos
Moufi: comercial
O seu nome teima em surgir relacionado com os grandes. Moufi é, no estilo, ofensivo, físico e rápido, o tipo de lateral que, em função desses fatores, se torna "comercial" para esses grandes que se imaginam a atacar sempre. Um jogador desse tipo pode rasgar desde trás defesas fechadas, imaginam. Moufi não é, porém, nenhuma pérola escondida. Chegou a cometer muitos erros, melhorou o seu jogo e nesses picos ofensivos vende-se bem. Pode fazer bons jogos num grande. Jogar bem neles, é mais complexo.
Gelson: destinos
Leio a entrevista de Gelson e percebe-se como pode facilmente um jogador deixar o seu talento fugir do seu trilho certo com uma ou duas más opções de carreira ou comportamentos que o futebol de excessos hoje sobredimensiona. A ida para o At. Madrid, onde não "casava" com as ideias de jogo de um treinador, e o empurrão a um árbitro já a jogar no bucólico Mónaco, após ver um vermelho. Se a primeira opção foi causa (previsível), a segunda foi efeito (já descontrolado). Pelo meio, o verdadeiro Gedson, talento em campo e cabeça equilibrada, desvanecera-se. Missão atual: voltar a controlar o destino do talento.
Leandro Antunes: ver
Um avançado-centro que sabe e gosta de jogar em largura, saindo muito bem desde a esquerda e com bom remate. Leandro Antunes, 22 anos, cresceu no Leiria, subiu a sénior no Braga, onde jogou nos sub-19 e na equipa B, mas depois caiu nas divisões secundárias, no Vilafranquense e, esta época, no Marinhense (emprestado) onde, no Campeonato de Portugal, deixou (com golos) mostra do seu potencial e qualidade. Pode ser boa opção, para testar a sua evolução, num clube médio de divisões superiores.