PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Feitas Lobo.
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1 Pode-se olhar para as causas de uma exibição através de vários prismas, mas quando sentimos que uma equipa falhou totalmente a abordagem que queria ter, tal está quase sempre relacionado com algo que começa na raiz da sua postura: o ter (ou não ter) a iniciativa de jogo.
Nas declarações de Fernando Santos no final do jogo com a Sérvia, mais do que ouvir como explicava o resultado, ouvi sobretudo, na sua descrição da exibição ao longo dos 90 minutos, como sucessivamente Portugal se foi posicionando para reagir à forma de jogar da Sérvia, que esteve sempre taticamente superior em campo (o que, pegando na raiz da postura, significava, no fundo, que estava a ser sempre ela a ter a iniciativa do jogo, ao contrário do que seria exigível para a seleção portuguesa).
2 Tirando aqueles dois minutos iniciais em que se terá visto de relance a intenção portuguesa, de pressionar alto, na bola roubada por Bernardo Silva a Gudelj, Portugal foi sempre em busca de encaixar no jogo sérvio.
Desde passar a alinhar a quatro no meio-campo quando viu que os sérvios, afinal, na dinâmica do seu sistema, metiam os alas por dentro e faziam um quarteto -em quadrado - no meio, até ao recuar um médio - Danilo - para terceiro central quando os sérvios passaram a jogar com dois pontas-de-lança, num ataque por dentro (em 2x1x2).
Em todas estas decisões que tomou, Portugal, em vez de promover novas dinâmicas de jogo para o seu futebol e assim perturbar e confundir os sérvios, preocupou-se, sobretudo, em ir atrás do que eles estavam a fazer e como os travar. Ou seja, em vez de promover dinâmicas para desencaixar e, com autodeterminação, mexer no jogo ofensivamente (criando movimentos de desequilíbrios) preferiu sempre posicionamentos para encaixar e fechar o jogo defensivamente (garantindo coberturas defensivas).
3 Uma disfuncionalidade de personalidade que começou pela escolha de um meio-campo (setor onde Santos vagueia sempre por entre dúvidas e constantes alterações de jogo para jogo) com o trio Danilo-Moutinho-Sanches pensado, sobretudo, para pressionar e segurar o meio-campo em vez da criatividade (e poder de iniciativa) que um triângulo com interiores subidos e Bruno Fernandes ou até Bernardo Silva por dentro, dariam ao nosso jogo. Mesmo olhando a intenção da exibição (pela opção inicial do onze e mudanças táticas) de Portugal ser baseada em travar a Sérvia, tal nunca o conseguiu com eficácia. E mais do que a insuficiência exibicional, tal comportamento reativo meteu o medo de perder dentro do corpo e mente dos jogadores portugueses (tornando-os ansiosos e taticamente receosos). O oposto da personalidade que se exigia. Foi, por isso uma derrota tanto tática como mental.
Como contrariar sistemas a três
Fernando Santos reconhece que a Seleção Nacional sente sempre dificuldades contra adversários estruturados com defesa a três e não encontra solução.
Nestes jogos, isso sentiu-se de forma diferente frente à Irlanda (pelo estilo de jogo mais combativo britânico) e à Sérvia, que meteu mudanças no sistema durante o jogo e tem para o interpretar um grupo de jogadores com alto nível técnico e visão de passe.
O intrigante nesta impotência está em, perante este facto tático, o nosso sistema não se mover para (quer na estrutura, quer nos princípios) desenvolver novas fórmula de jogo, dentro da nossa identidade de posse e técnica apoiada tantas vezes desprezada como contra a Sérvia em nome da inócua "password" da pressão que secundariza a palavra jogar.
Em tese, vejo o 4x4x2 (clássico, losango ou 1x3x") como a melhor estrutura para o contrariar. Como? Com os laterais a subir e jogando cara a cara com a subida típica dos laterais adversários no sistema a três, metendo alas mais por dentro e ganhando superioridade numérica no meio-campo central, e no ataque ter dois avançados, um fixo outro móvel, para não deixar os três defesas adversários sair a jogar. A cristalização do nosso sistema (com o meio-campo sempre a mudar) impede estas variantes.
Gavi: o estilo
Xavi precisa reconstruir o Barcelona sem um jogador como ele era, mas o presente tem revelado que exemplares cada vez mais sólidos dessa corte estilística. A seleção espanhola também o comprovou. No Euro, com Pedri, e agora, na fase decisiva para o Mundial, com Gavi, apenas 17 anos. Um médio interior ofensivo que sabe vir buscar jogo atrás, recebe de costas, roda e sai a jogar com classe, visão e passe. Feito em La Masia, é o futuro para manter a dinastia de estilo da Espanha do toque e passe.
Kvaratskhelia é craque!
A elegância e qualidade técnica com que joga no controlo de bola, invadindo espaços em antecipação ou recebendo com inteligência, a romper e tabelar, fazem de Khvicha Kvaratskhelia, 20 anos, um dos mais promissores talentos escondidos do futebol internacional. Feito no Tbilisi, está no Rubin Kazan russo desde os 17 anos. Forte (1,83m), ambidestro, gosta de descair para pegar jogo na esquerda. É um avançado móvel que tanto lê o jogo como médio-construtor, como depois assume papel de ataque á baliza.
Táctica: "Ibra-Suécia"
Durante muito tempo, o contra-ataque sueco (partindo do seu 4x4x2 clássico com linhas baixas) foi assustando a Espanha. As diagonais para pegar por dentro e rematar de Fosberg, a velocidade de Kulusevski quando abria e Isak sempre oportuno na frente, criaram lances de golo até que a meio da segunda parte o treinador Jan Andersson foi tirando-os para reforçar meio-campo e lançar o plano-Ibraimovic. Ou seja, em vez de uma equipa, apostou num homem para jogar acima da equipa nos últimos 15 minutos. Nunca mais criou uma ocasião de perigo e perdeu. O caso em que uma equipa jogou melhor que o seu treinador até este próprio a tirar de campo! Perturbante.