Rui Costa calou muitos presidentes de bancada, já de facas afiadas e pedras na mão
A JOGAR FORA - Opinião de Jaime Cancella de Abreu
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1 - Para Arouca não foi cometido o mesmo erro de Braga, de modo que a não convocação de Enzo somou-se às ausências dos lesionados Rafa e Gonçalo Ramos - três titularíssimos da primeira metade da época fora do onze para um jogo em casa de uma das mais difíceis equipas da Liga, marcado para um dia que muito estranhei, o do fecho do mercado. A equipa apresentou-se, não obstante, tranquila, com uma maturidade tática tal que lhe permitiu superar as ausências e as turbulências, controlando o jogo do princípio ao fim para o vencer de forma concludente, apesar do miserável estado do relvado - e assim concluiu, cem por cento vitoriosa, o difícil ciclo de três jogos seguidos fora de casa.
2 - Só quem se sente muito à vontade pode dispor-se a dar as explicações com que Rui Costa nos brindou a propósito da polémica venda de Enzo Fernández. Com isso calou muitos presidentes de bancada, já de facas afiadas e pedras na mão, como se o reiterado mau comportamento do argentino e a enormidade do valor arrecadado deixassem margem para dúvidas, quanto mais para críticas. Aquele que Vieira - tido como implacável negociador - considerou impreparado e preguiçoso, "puxou para baixo as calças a Boehly" (ironia de Souness), fez descer - coisa inédita entre nós - a percentagem das comissões e estabeleceu um novo recorde mundial para a venda de um médio!
3 - Foram 58 763 aqueles que nas bancadas da Luz viram ao vivo e a cores várias das melhores obras do atual acervo de Roger Schmidt: uma equipa muito organizada e intensa, em acelerada velocidade de cruzeiro, com automatismos que fazem das adaptações verdadeiras soluções, uma organização defensiva que tem feito de Vlachodimos um quase espetador, o melhor João Mário de sempre - e que azia vai provocando nos sportinguistas... -, um Chiquinho a ser paulatinamente transformado em Chicão, e Neres, agora no meio, em nova explosão de forma. Bom, e como se isto tudo não bastasse, tiveram o privilégio único de participar num sentido "obrigado" a André Almeida!
4 - Em Portugal anunciam-se acordos de pagamento de avultadas dívidas com barbas de 16 anos no dia do jogo entre o devedor e o credor; dispensam-se, sem pingo de vergonha, jogadores-faz-de-conta que fizeram parte de trocas de milhões para enganar o fair play financeiro; é alegremente encarada como corriqueira a vigésima segunda expulsão de um treinador reincidente em comportamentos à margem das leis e dos costumes; e, no entanto, o que o país quer debater são as contas da venda de Enzo, já que nem as de Porro, que Varandas não se deu à importância de explicar, foram tão escalpelizadas.