PLANETA DO FUTEBOL - O melhor aliado de Jesus para a formação deixar de ser referência: a nova geração que está a subir não tem o mesmo talento das anteriores.
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1 Os projetos mudam, mas, mesmo que nasçam duma "gincana ideológica resultadista", Jesus tem um aliado na conjuntura do atual futebol benfiquista para deixar de ter a formação como referência: esta nova geração que está a subir ao nível sénior não tem o mesmo talento da(s) anterior(es).
Não existe nela, nem por sombras, nenhum Bernardo Silva. Gonçalo Guedes ou Cancelo, nem Renato Sanches, Félix ou Rúben Dias.
Ao contrário destes jogadores, em que se via bem como já saíam a jogar desde o berço (cada qual na sua posição e estilo), a atual fornada precisa mesmo de nascer mais algumas vezes.
Este pode ser o argumento de que Jesus precisa para não apostar na formação como os seus antecessores (Vitória e Lage, que, recorde-se, ganharam com ela). Mesmo o defesa-central Morato, que gosto de ver jogar, com técnica de passe longo muito evoluída, poderá não ter um espaço no "T4" que em geral compõe o número de centrais num plantel.
2 O único fator que conheço para decidir entre um jogador-miúdo de 19/20 anos e um dito "experiente" de 28/29 é a qualidade. E essa nunca a vi descrita, seja de que forma for, num BI (ou CC) dum jogador de futebol.
Não acredito na tese dos jogadores experientes como princípio de sucesso. Ela é importante, claro, para não cometer erros iguais, por já terem antes passado por situações semelhantes, mas nunca pode ser um valor de análise absoluto. Pelo contrário, é sempre qualitativamente relativo.
É difícil adivinhar essa qualidade a médio-longo prazo? Claro que sim. Mas para isso é que existe quem acerte mais do que outros. Ela tem de ser vista, em antecipação, pelo treinador. E depois fazer o que tanto insisto ser mais decisivo do que a formação de base para uma confirmação consistente ao mais alto nível sénior: a maturação da formação.
3 Qualquer critério na composição dum plantel é legitimo. O treinador que quer jogadores feitos não pode ter o mesmo discurso com aura de "superioridade moral" do que aposta na formação e perde, pegando na tese resultadista do início do texto, a maior capa de proteção atrás da qual se esconder no caso de a bola não entrar.
Os últimos anos fizeram disparar novamente as teses e arautos da formação em Portugal. Nenhum clube quis ficar atrás. O FC Porto reagiu logo também a forçar craques que, nalguns casos, necessitavam da tal maior maturação e o Sporting reacordou para esse seu legado remoto em que fazia criativos ofensivos no pré-Academia, em pelados ou no relvado de treino junto ao velho Alvalade, do qual voltavam depois aos balneários atravessando a rua por entre carros e adeptos. Velhos tempos.
Os clubes capturados
As mudanças de treinadores sucedem-se. Na I Liga, dez mudam no comando dos bancos em relação à época anterior. Existem várias motivações para o fazer e nem é obrigatório que na base dessa decisão esteja o insucesso. Há casos, como o de João Henriques no Santa Clara, dum esgotar de ciclo mútuo entre clube e treinador e a necessidade natural de este procurar novos desafios/motivações. Intriga-me não ter chegado, mas, para isso, teremos de entrar nos subterrâneos de mercado. Nem todas as escolhas têm, como gosto de chamar, linhas de pensamento "bacteriologicamente puras". Há interesses e potenciais vantagens colaterais (mercado de jogadores e influências no status futebolístico de forças) que jogam muito, um papel decisivo, para a escolha final.
Há demasiado clubes capturados por interesses, já transformados mesmo em máquinas de gestão com satélites de influência e negócio fora do clube. Podem chamar-lhe gestão moderna, mais avançada ou eficaz, de um clube de futebol. Só uma parte reduzida pode dizer, porém, que cresça para além dos "interesses da época".