PLANETA DO FUTEBOL - O cronista Luís Freitas Lobo escreve hoje sobre o dérbi da Invicta, no qual o FC Porto venceu o Boavista por 2-0.
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1 - Treinadores na bancada, jogadores no relvado. Controlo remoto tático. O Boavista sabe posicionar-se, fechar atrás e quis estender-se (até pela tipologia dos médios e avançados) a atacar. Sabe, claro, prioritariamente, perceber a lógica de ganhar a primeira bola (interceção do passe), a segunda (ganhar ressaltos e divididas) e até a terceira (que sobra depois disso).
Mostrou-o desde o início, na forma como se plantou no Dragão, com o onze bem distribuído, espalhou a sua camisola aos quadradinhos no relvado dividindo-o em... papel quadriculado (cada quadrado, cada metro quadrado de marcação/saída). Preparou-se para enfrentar assim um FC Porto que joga contra a margem de erro inexistente e sente que cada jogada pode ser a mais importante. Sente-se desde o primeiro toque a ansiedade de quem busca resgatar o primeiro lugar.
O bloco médio do Boavista procurou perseguir Corona e soube aguentar atrás, apesar das intenções iniciais.
2 - Tudo parecia, com o passar do tempo, ficar cada vez mais amarrado, até um momento que foge à quadrícula tática: a do um para um. Brahimi forçou-a na área, num gesto que tantas vezes faz, em busca da linha para uma última finta quando o relvado está a... acabar. Sofreu o toque e o penálti deu a Soares o olhar para a baliza concentrado, desbloqueando o resultado nulo.
O bloco médio do Boavista procurou perseguir Corona e soube aguentar atrás, apesar das intenções iniciais. Teve de baixar as linhas e saber viver para defender (e bem), mas este é o melhor 4x4x2 portista: o que junta um terceiro médio vindo da ala, falso avançado, falso médio, duplo jogador tático, verdadeiro para o desdobramento dos sistemas. Otávio, claro, no apoio a dois pontas de lança "carros de assalto": Soares-Marega (num dia de jogo que dava para ter Corona como lateral-direito sem abrir fendas defensivas em transição pós-perda da bola).
3 - O plantel do FC Porto tem margem para alterações, mas o melhor onze do FC Porto não. Nesse ponto que decide títulos, não adianta forçar jogadores de jogos grandes onde eles não existem. Soares é. Adrián não é (com todo respeito pela memória no At. Madrid, mas o Dragão e o nosso futebol contam outra história). Manafá corre muito atrás e à frente, mas isso não quer dizer que ataque e defenda bem. Quer dizer que é muito rápido para estar tão depressa num local como noutro.
Fugir a isto é fugir à realidade e esperar que esta não repare. Em jogo, contra equipas médio-pequenas, ela pode estar distraída. Nos jogos grandes, nunca. Não sei se o clássico com opções de plantel em vez de opções de onze-base será decisivo no título, mas para já é decisivo no líder da classificação. O destino nunca está escrito, mas tem claramente melhores formas de o ser.
O falso lento
Sempre foi um conceito curioso no futebol: o chamado "falso lento". O jogador que parece sempre jogar mais devagar que os outros, que parece em câmara lenta, que parece correr menos e destinado a chegar atrasado à bola. Parece (viram quantas vezes escrevi essa palavra nas frases anteriores?). É a razão de antes utilizar só uma vez a palavra "falso".
O passado consagrou o craque Pedro Barbosa como o expoente máximo desse jogo mentiroso que a sua velocidade de execução com capacidade técnica denunciava sempre que fazia uma jogada que resolvia jogos. Hoje há cada vez menos espaço no futebol para este tipo de jogadores, tal a forma como os arautos da velocidade tomaram conta do jogo. Nada de falsidades. Sinceridade rápida.
Eis então que Gabriel tinha chegado ao onze do Benfica e sustentado que se podia jogar de outra forma a partir da... velocidade a pensar. Um n.º 8 para fazer a bola descansar um pouco antes de seguir caminho para a frente. Sem ele, o Benfica vai repensar a posição. A bola vai ficar confusa. Onde costumava ter abrigo de falsidade lenta, vai passar a ter acelerador físico?