Pizzi nasceu longe de casa
Por isso, quando se pergunta até que idade (ponto da carreira) um jogador pode evoluir, eu refiro até ao... último dia da sua carreira.
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1 - Recordo um extremo rápido, truculento, a correr pelo lado esquerdo, que todos anteviam ser um velocista perigoso para o Braga usar no futuro. Como estava ainda imberbe futebolisticamente, foi emprestado ao Covilhã que, ironia, sairia ao Braga na Taça. Jogou e, pelo tal lado esquerdo, fez um jogaço como extremo a deixar a defesa do Braga em pânico. No ano seguinte, claro, acharam melhor fazer voltar a casa aquele extremo veloz e atrevido. Isto era Pizzi no início da carreira sénior, como jogava e como era projetado no futuro.
Nessa versão, nunca se impôs no Braga. Na passagem de Jardim para Peseiro, surgiu então a n.º 10 de um losango em 4x4x2. Ia começar assim a época quando um negócio do "futebol dos empresários" o levou para o Atlético de Madrid. E foi. Como eu temia, o Atlético nunca soube o que fazer com ele. E saiu. Tudo num "negócio natural", mas, como noutros deste género, podia ter arrumado com a carreira de um jogador ainda a fazer-se (na maturidade e no jogo, mente e posição).
2 - Só quando Jesus entra no seu melhor laboratório de invenções, que eu identifico nos tubos de ensaio dos n.ºs 8 mais improváveis antes... de o serem, é que Pizzi (o Pizzi que hoje conhecemos e de quem Lage diz que nunca viu um futebolista igual) nasce por fim. Do outro que falei no início do texto, nem rasto. Mesmo quando o metem na faixa (o que Rui Vitória começou a fazer e Lage continua), já não existe nem um mero traço do extremo de origem. Vê agora o flanco apenas como uma casa tática de partida para outros espaços. E surge como interior. A recuperar ou a finalizar. Um n.º 8 que joga debaixo da relva até aparecer por cima dela a desequilibrar.
A visão de Jesus para inventar n.ºs 8 (como fez também com Enzo, outro extremo que meteu a jogar rotativamente pelo meio, ainda o fazendo hoje no River) criou o Pizzi que hoje desequilibra jogos.
3 - O último, com o Braga, que o via como extremo e o apanhou agora como médio todo o terreno, a relacionar faixa e zona central, confirmou como Pizzi conduz hoje todo o jogo encarnado. Não existe ponto de contacto ente a sua origem e o presente. A criação ultrapassou o progenitor por força da intromissão de um criador (Jesus, não podia haver melhor nome) que fez dele um jogador que, antes, ninguém tinha visto ou imaginado. Nem o próprio Pizzi, aposto.
Por isso, quando se pergunta até que idade (ponto da carreira) um jogador pode evoluir, eu refiro até ao... último dia da sua carreira. Até ao último treino, mesmo. Taticamente, a todos os níveis de leitura. Tecnicamente, disfarçando lacunas de execução. Pizzi é uma fabricação tática que devia servir de "case study" mais elaborado.
Braga: pode este 4x4x2 tornar-se opção consistente no campeonato?
Gostei de ver o Braga surgir em 4x4x2 na Luz. Era jogo para se assumir e dizer que os resultados negativos no campeonato têm sido erros exibicionais de casting. Com mais espaço para atacar, entrou bem no jogo, esteve a ganhar, ia estabilizar essa afirmação tática, teve uma quebra (há, no plantel, um problema na baliza, já o escrevi há muito) e acabou em busca do empate.
A questão que agora coloco é se este 4x4x2 (que juntou Rui Fonte e o falso segundo n.º 9, Ricardo Horta, no centro do ataque, mas pode juntar antes Paulinho) pode tornar-se opção consistente no campeonato contra as tais equipas pequenas que se fecham e que o Braga sofre para furar. Pode, mas não é fácil.
Exige um treino específico para jogar melhor em espaços curtos aplicado a ataque organizado (em 30 metros). Nunca terá, em princípio, latifúndios de ataque rápido como na Luz. Antes de um desafio a como a equipa pode jogar, será um desafio a como Sá Pinto a pode treinar para jogar assim. Passar a ser uma equipa mais do treinador do que os jogadores podem dar pelo valor individual.