Pizzi e Rafa podem jogar juntos
É o resto da equipa que tem de garantir esses equilíbrios e o papel do treinador é dotá-la dessa capacidade sem, com isso, tirar os diferenciadores que ganham jogos
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1 - Confesso que já não me sucedia há muito tempo. Seguindo as suas estradas táticas mais conhecidas, os treinadores estão cada vez mais previsíveis na forma como mexem no decorrer dos jogos. Pensei o mesmo comentando o Vitória-Benfica quando, a perder a meio da segunda parte, Pepa preparava-se para mexer com jogadores... previsíveis saídos do banco (um avançado-extremo agitador, Quaresma, e um médio n.º 8, Janvier).
Este foi também um jogo que fez-me ficar a pensar na minha convicção de ser contra as cinco substituições (por favorecer mais fortes, por levar os treinadores a meter jogadores sem critério no fim, etc.).
Nessa altura, a equipa até estava a pressionar/jogar bem. Imaginei que fosse reforçar essas dinâmicas mas Pepa apostou em mais do que isso. As trocas não foram diretas, mudou sistema e dinâmicas, desencaixou referências, confundindo taticamente o Benfica que buscava então acalmar para voltar a controlar e alterou totalmente as coordenadas do jogo.
2 - É este o ponto que hoje, além do natural rasgo individual do jogador, pode mudar o futebol: a imprevisibilidade dum treinador durante um jogo. Ou seja, jogar ele desde o banco de forma a mudar a equipa e o jogo todo.
Tirando o trinco (Alfa Semedo) o médio subido mais "pica-pedra" (André André), alterou o 4x3x3 (no qual o Benfica já detetara todas as referências espaciais de marcação) para um sistema móvel de dois médios de perfil a sair em construção (Janvier-Tiago Silva) e puxou o truculento extremo Edwards para segundo avançado atrás do ponta-de-lança Estupiñán (depois Bruno Duarte), enquanto Quaresma entrava para inventar na faixa. No papel era um 4x2x3x1, na dinâmica seria um 4x4x2, na prática era meter o jogo todo numa caixa tática inventada por ele e agitá-lo ao ponto de desencaixar todas as referências que o Benfica tinha mas que, a partir daí, nunca mais reencontrou.
3 - Jesus, no fim, tanto elogiou a reação do Vitória como criticou os seus jogadores que não entraram bem para, no tal "jogo dos treinadores", responder a Pepa. Ao invés, todas as alterações de Jesus foram previsíveis. A equipa não se mexeu com nenhuma e Jesus acabou a dizer que, numa delas, Weigl (inserido para travar Edwards no meio) entrara "sem perceber bem o que tinha de fazer".
Este foi também um jogo que fez-me ficar a pensar na minha convicção de ser contra as cinco substituições (por favorecer mais fortes, por levar os treinadores a meter jogadores sem critério no fim, etc.). Se forem feitas desta forma, quase simultânea, para mudar sistema e plano de jogo (ou seja, ter uma lógica conjunta coletiva e não meros revulsivos individuais) pode ser como meter os treinadores verdadeiramente em campo. Mas isto só poucos o conseguem (ou arriscam) fazer. É uma imprevisibilidade preparada. Em Guimarães, num jogo eletrizante, Pepa mostrou como esteve à frente desse tempo.
Pizzi assistiu ao sufoco final de fora e Rafa viu-o, impotente, em campo. Algo bate mal no fim desta história (ao invés de como começou). Afinal, a diferença que vai entre Pizzi e Rafa juntos ou separados.
Algo bate mal no fim desta história
Vejo o último lance do Benfica em Vizela, como Pizzi cruza/passa com precisão e Rafa surge a finalizar, e penso na combinação perfeita entre os dois. Pouco depois, porém, ouço Jesus a dizer que "sim, mas os dois juntos não pode ser porque não defendem".
Percebo a análise inserida nas obrigações da equipa ter diferentes jogadores-chave para diferentes momentos (ataque-defesa-ataque) do jogo, mas se para isso a solução é tirar os dois que melhor combinam (e resolvem o jogo) então é como virar o futebol de pernas para o ar.
É o resto da equipa que tem de garantir esses equilíbrios e o papel do treinador é dotá-la dessa capacidade sem, com isso, tirar os diferenciadores que ganham jogos (independente do sistema)
Em Guimarães, Pizzi surgiu a titular numa jogada tática de Jesus ao metê-lo no meio (no 3x4x3), à frente do duplo pivô. Nesse espaço, com visão, timing de mudança de ritmo e passe, fez um jogo perfeito que colocou o Benfica a ganhar. Quando saiu, na fase de reação vimaranense, entrou Rafa (após ter tentado João Mário). A equipa nunca mais se encontrou.
Pizzi assistiu ao sufoco final de fora e Rafa viu-o, impotente, em campo. Algo bate mal no fim desta história (ao invés de como começou). Afinal, a diferença que vai entre Pizzi e Rafa juntos ou separados.