A hiperparentalidade e a procura do atleta perfeito
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Todos já testemunhámos ou ouvimos histórias de pais de jovens atletas que são agressivos, obsessivos e prepotentes manipulando de forma maníaca a formação desportiva dos seus filhos.
Esta falta de autocontrolo é uma vergonha. Os pais, tão racionais, pacientes e afetuosos em casa, facilmente se transformam num ogre assustador num treino ou jogo dos filhos.
Alguns estão tão narcisisticamente envolvidos no jogo do seu jovem atleta, com a sua autoestima a subir ou a descer com base no nível de jogo e competência do filho, que quando a sua "estrela" joga mal ou é subutilizado não se contêm e despertam o pior de si.
Ou reprimindo-os e envergonhando-os no regresso a casa, em que o que mais precisam, depois de um mau jogo, é apenas de um pai e não de um colérico comentador desportivo que se autonomeou o maior perito em formação, tática e substituições.
Facto: onde há desporto juvenil, há episódios tristes e abusos por parte dos pais sobre os árbitros, treinadores, adversários e, sim, por vezes, com o próprio filho(a). Em casos extremos, mas demasiado comuns, tais pais infringem a lei.
O que deveria ser uma festa, com um ambiente sadio e de diversão, de fair-play e camaradagem, entre amigos, transforma-se mesmo num pesadelo, prejudicando a autoestima e a competência dos atletas, o que é inadmissível. Os gritos, insultos e confrontos físicos desencorajam os jovens atletas, mas pior também modelam o seu mau comportamento, por mimetismo do que vêm o progenitor fazer.
A conduta dos pais influencia sempre a forma como os filhos se irão relacionar com o mundo e com as pessoas. Sabemos que todos os pais têm expectativas muito altas sobre os jovens praticantes, mas é preciso perceberem que nem todos serão o Cristiano Ronaldo e que muitas vezes ao invés do filho ser o melhor futebolista, este vai ser o pior, por muito que lhes custe. O que não quer dizer que não possa ser o melhor noutro desporto ou atividade. Educar é acompanhar e influenciar, de alguma forma, o desenvolvimento da aprendizagem, das capacidades físicas e intelectuais. Sendo que tais capacidades podem não ser as indicadas para o futebol, por exemplo, mas sim para outros desportos.
Neste contexto, importa dizer que que nem todos os pais são assim e valorizamos a importância destes em "alimentar" os filhos, em conduzir os mesmos aos treinos, encorajando-os, apoiando-os; conhecemos os sacrifícios que fazem na organização da sua vida e nas rotinas familiares para que os jovens atletas possam treinar e competir; mas os adultos estragam tudo quando querem ter a sua própria agenda e motivações (alheias às dos atletas) e querem ser estes a dar instruções para dentro do campo, em vez do treinador, deixando as crianças ou jovens muito confusos sobre a quem devem obedecer. Por vezes, punindo e repreendendo os atletas, sendo excessivamente críticos e insatisfeitos com o rendimento. Ou reprimindo-os e envergonhando-os no regresso a casa, em que o que mais precisam, depois de um mau jogo, é apenas de um pai e não de um colérico comentador desportivo que se autonomeou o maior perito em formação, tática e substituições.
Na verdade, não sei se tal fenómeno acontece apenas no desporto de formação. Acho que nos dias de hoje se exige demasiado das crianças, ocupando cada segundo das suas vidas, exigindo mais e mais, o que é errado. Afinal, tudo isto, esta hiperparentalidade exagerada é, em grande parte, uma extensão de como nós, enquanto adultos, abordamos também o nosso trabalho e a nossa vida pessoal, sobrecarregando excessivamente o nosso calendário e rotinas, vivendo em permanente stress, com o conta-rotações no máximo e com uma glorificação do tempo sobreocupado que merece também introspeção.
Os pais devem sentir-se imensamente felizes e orgulhosos pela participação dos filhos na prática desportiva, estão a dar-lhes a oportunidade, não só de aprender um desporto maravilhoso, mas também de melhorar o seu desenvolvimento como ser humano, mas não podem nunca fazer depender essa felicidade dos resultados ou da performance dos filhos.
Este é só mais um alerta de que basta de sobredimensionar o desporto em detrimento do desportivismo, teimem no ensinamento deste último e vão ver como os vossos filhos prosperam.