OPINIÃO - A pureza da Taça e as necessidades financeiras
TÁTICA DO PROFESSOR - A Taça continua a ser muito querida pela característica peculiar de fazer dos pequenos grandes.
Corpo do artigo
1 - As Taças dos diversos países são sempre uma motivação extra para as equipas mais modestas, que encontram nessas competições uma possibilidade de alcançarem algo que, no campeonato, é praticamente impossível. Durante muitos anos, quando não havia ainda transmissões de jogos do campeonato, a Taça de Inglaterra era um momento muito apreciado pelos portugueses. Normalmente jogada ao sábado, a final era o jogo mais esperado do ano. Parecia até que andávamos um ano inteiro à espera desse dia. E eram espetáculos realmente a que não estávamos habituados: pela intensidade com que eram jogados, pelo ambiente, pela surpresa sempre aguardada de ver uma equipa de um escalão inferior ser superior à do escalão superior. E torcíamos pela mais pequena, invariavelmente. Eram espetáculos emocionantes que nos deixavam água na boca. Durante muitos anos, a final da Taça de Inglaterra foi para nós não um jogo, mas o jogo. E grandes memórias nos deixou.
2 - Por cá também nos habituámos a olhar para a Taça de Portugal como uma competição muito amada, como ainda hoje é, muito pela possibilidade que abre aos mais pequenos de se tornarem nos chamados tomba-gigantes, uma expressão muito feliz e que tem tido muitos clientes. Eu próprio já sucumbi perante surpresas dessas, tanto no Benfica, com o Gondomar, como no FC Porto, com o Atlético. São momentos amargos para quem perde numa situação em que é claramente superior e favorito, mas são momentos de júbilo e de excitação para os adeptos ganhadores, que veem assim cumprido um sonho. A Taça de Portugal continua a ser uma competição muito querida por causa dessa característica muito peculiar de fazer dos pequenos grandes. No campeonato, isso seria praticamente impossível. Basta ver que na história do futebol português há apenas cinco campeões, o Boavista, o Belenenses, ambos por uma vez, e depois FC Porto, Benfica e Sporting dividem as vitórias no campeonato. Na Taça, já não é tanto assim. Clubes bem mais modestos do que os três grandes já conquistaram o troféu: Beira-Mar, Estrela da Amadora, Leixões, Académica, Braga (2), V. Guimarães, Boavista (5), V. Setúbal (3). E as recentes transformações que a FPF introduziu na competição têm possibilitado finais em que os três grandes não estão presentes ou só está um deles. Basta relembrar que a última final entre dois grandes aconteceu em 2008, entre o FC Porto e o Sporting. Significa isto que nos últimos dez anos, pelo menos dois dos três grandes não chegaram ao ambicionado Jamor. As meias-finais a duas mãos também contribuíram para este facto. E, depois, claro, há o empenho das equipas em chegarem longe na prova e conquistarem um título. A Taça de Portugal, como a Taça da Liga, bem mais recente, dá essa possibilidade aos clubes mais pequenos. Esse é um dos motivos por que a Taça de Portugal é tão amada.
3 - Outra das alterações promovidas pela FPF, e bem, foi o condicionamento do sorteio, que obriga, nesta fase da competição, as equipas dos escalões superiores a jogarem em casa das dos escalões inferiores. O objetivo é claro: dar mais competitividade à prova, permitir que as equipas mais pequenas tenham mais uma possibilidade de baterem o pé às grandes. Mas, mais do que isso, proporciona uma grande festa aos adeptos que, de outra forma, não poderiam ver "in loco" o Benfica, o FC Porto ou o Sporting. Há depois a outra questão: para os clubes, receber um grande é também a oportunidade para fazerem algum dinheiro extra, em muitos casos que lhes dá para pagar a época. O Sertanense optou por receber o Benfica em Coimbra. Não tenho dúvidas de que para as gentes da Sertã, teria sido fantástico receber o Benfica na sua terra, mas o futebol, a pureza do futebol, raramente se compadece com as necessidades financeiras...