O "fenómeno" Eleven Sports em Portugal ainda agora começou
"Para o telespectador nacional, a confusão instalou-se! Como assistir aos jogos que via na TV, onde apenas tinha de escolher o canal Sport TV na box?"
Corpo do artigo
No final de 2015 deu-se o 1.º abalo nos hábitos caseiros quando a Altice entrou em força na disputa dos direitos televisivos dos clubes e assinou contratos com Porto, Rio Ave, Boavista, Vitória de Guimarães e Farense, quebrando o monopólio da Sportinveste e NOS. Para já, o espectador não nota a diferença, pois a BTV continua (até ver) a transmitir os jogos em casa do Benfica e a Sport TV todos os restantes desafios das duas ligas nacionais.
Não sei se esse negócio (que terá sido bom para aqueles clubes e os coloca em vantagem face à concorrência) será suficientemente compensador para a Altice ou se esta estará arrependida de entrar num "jogo" em que apenas representa sete equipas (19,4%), enquanto a NOS detém os direitos das restantes 29 (80,6% do mercado e os dois players mais atractivos). Só o futuro o dirá, embora eu admita que os direitos de transmissão televisiva dos clubes em Portugal vão sofrer alterações a curto prazo.
Questão diferente e mais complexa está em curso, com a recente e vigorosa entrada da Eleven Sports no mercado português das transmissões televisivas premium. Empresa que aposta tanto na difusão em TV "tradicional" como nas novas plataformas de "streaming", conquistou, num ápice, os direitos de transmissão da Liga dos Campeões e das ligas espanhola, francesa, alemã, belga e holandesa, para além da Fórmula 1 e do que mais virá. A Sport TV, por seu turno, ficou com a Liga Europa e as ligas portuguesas, inglesa, italiana e sul-americanas, entre outras.
Para o telespectador nacional, a confusão instalou-se!
Como assistir aos jogos que via na TV, onde apenas tinha de escolher o canal Sport TV na box?
A Eleven Sports procurou logo de início o confronto com os operadores NOS, Altice e Vodafone (os "big three") e colocou o seu produto desportivo Premium na que é, garantidamente, a plataforma menos representativa, com mais baixa cobertura e maior número de reclamações que temos: a NOWO.
Ciente do erro cometido mas não querendo emendar a mão, implementou uma plataforma de "streaming" com uma box que exige internet de alta velocidade, enquanto continuam as negociações com os três maiores operadores. A cada dia que passa, as negociações serão mais difíceis, porque nenhum dos oponentes mostra vontade de ceder.
A Eleven tem bons produtos, pelos quais pagou caro, e quer retorno, retorno que é insuficiente com os meios que disponibiliza aos espectadores. O aumento rápido que teve de assinantes com o início das transmissões da Liga dos Campeões deverá continuar, mas num ritmo cada vez mais lento. O céu não é limite e a Eleven precisará no mínimo de 250 000 assinantes para garantir o investimento efectuado. Mesmo com bons capitais próprios e uma caixa volumosa, o ADN desta empresa assenta em operações lucrativas. Pode aguentar, mas não lhe convém esperar muito, até pelo perfil conservador do consumidor português.
Do lado da NOS, Altice (accionistas da Sport TV) e Vodafone, pelo contrário, aguardar é, até certo ponto, a melhor estratégia, pois estarão a contar com a acrescida necessidade da Eleven de colocar os seus canais desportivos nas nossas televisões e ter acesso imediato e directo a milhões de lares, mas em condições que interessem aos operadores. Embora a faca e parte do queijo estejam do lado desses operadores, a espera tem limites, pois correm o risco de perder assinantes para a concorrência, seja de pacotes básicos seja dos produtos premium. Os dados estão lançados e as próximas semanas vão ser decisivas.
Julgo, contudo, que esta investida da Eleven Sports em Portugal não ficará por aqui. Por toda a Europa, o mercado dos direitos televisivos está cada vez mais complexo e repartido. A era das transmissões a várias horas de diferentes dias já faz parte da Idade da Pedra e evoluiu para a venda dos direitos repartidos por países e regiões, por plataformas concorrentes, por conjuntos de jogos divididos "às postas". Trabalhar as transmissões de futebol está cada vez mais parecido com o mundo das apostas desportivas. Em vez de vender um bolo global por menos, o novo marketing leva a cortar o mesmo às fatias, com o resultado final a permitir encaixar uma soma mais avultada e dividir a "operação" por diferentes operadores especializados nos respectivos mercados ou que decidam avançar para novas formas de difusão de sinal.
Posso estar enganado, mas vamos chegar a esse modelo mais cedo do que se pensa. E os clubes, todos eles e não apenas alguns, ficarão a ganhar.