O FC Porto ganhou com a sua identidade, sistema e princípios
PLANETA DO FUTEBOL - A análise ao Clássico entre o Benfica e o FC Porto
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1 - Os jogos decidem-se no relvado, com a bola nos pés dos jogadores, mas começam a ganhar-se (ou perder-se) antes na cabeça dos treinadores. São eles que traçam o plano de ação (modelo e/ou estratégia) e, sobretudo, reação (o que fazer se, em campo, esse plano, sempre no lado improvável do jogo, passa a correr bem ou mal).
Os jogadores do FC Porto pareciam crescer por todos os lados, mas nenhum deles vinha de debaixo da relva.
Embalado pelo "berço dos elogios" o Benfica ativou o seu modelo (e mobilidade preferencial de princípios do sistema) em "piloto automático". A teoria dos estímulos e da confiança (em excesso ou como motor motivacional) pode explicar o lado mental de como as equipas entraram no jogo e reagiram emocionalmente ao seu primeiro impacto. O FC Porto com serenidade. O Benfica com ansiedade a meio da primeira parte como se faltasse cinco minutos para acabar.
Via-se na reação dos jogadores (sobretudo Pizzi, o motor mais nervoso quando deve ser o taticamente mais lúcido) e via-se na forma de jogar, com passes longos a buscar profundidade imediata, porque sentia que a pressão e coberturas portistas a meio-campo (no centro do jogo e do terreno) lhe retiravam espaço para jogar... elaborando. A sensação que deu foi clara: o Benfica não estava preparado para reagir à adversidade, nem mentalmente, nem taticamente.
Ganhar um clássico destes significa três pontos mais afirmação de personalidade para capitalizar no futuro
2 - Nesse sentido, a "tática azul do urubu" tinha tudo para tomar conta do relvado. O "urubu" Uribe, um médio caça-pressão (14 recuperações) que junto com Danilo montou a tenda estratégica de controlo (da velocidade alheia) e domínio (de ativação do ataque próprio). Os jogadores do FC Porto pareciam crescer por todos os lados, mas nenhum deles vinha de debaixo da relva. Estavam lá todos desde o início com um sentido de "jogo posicional" (coberturas e mobilidade para criar linhas de passe gerando... espaços) irrepreensível. O berço azul, ao contrário do encarnado, tinha sido abanado durante a semana e isso faz toda a diferença (fez) na forma como se prepara um jogo. E, depois, claro, se o joga (sobretudo se, de repente, o "imponderável" sucede).
3 - O FC Porto ganhou com uma clareza que não resultou de nada de novo que Conceição inventou para este jogo. Essa é a sua maior vitória (para além do simples resultado). Ganhou com a sua identidade, sistema (e princípios) preferenciais/habituais de jogo. Não ganhou por nenhuma estratégia específica pensada para um só jogo, contra este Benfica. Meteu uma nuance ou outra, no controlo central subido e na busca do jogo por fora para "atrair" (muito bem Luis Díaz), mas não mudou nada de essencial. Só assim, ganhar um clássico destes significa três pontos mais afirmação de personalidade para capitalizar no futuro (com o modelo identitário próprio).
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O óbvio mal escondido
Raúl de Tomás tornou-se o alvo das críticas ao jogo encarnado. São, porém, redutoras e insensíveis ao facto de ele estar a jogar fora da sua posição (um n.º 9 a jogar como segundo avançado) pedindo-lhe que reproduza movimentos que antes eram feitos por outros jogadores (Jonas ou João Félix, cada qual no seu estilo) quando ele não tem características para isso. Teria mais Chiquinho, como tentou Lage já o jogo ia longe.
É irresistível lembrar que o futebol é, em campo, um jogo de "pequenas sociedades" entre os jogadores que jogam mais próximos uns dos outros ou têm obrigação de combinar. Seferovic-Tomás é uma dupla para jogar de perfil. Pode, em jogos menores, funcionar com um (Tomás) atrás do outro, mas não nos jogos de exigência mais alta. Não faz sentido julgar (sumariamente) um jogador por não fazer aquilo para que não está vocacionado.
Já em outras análises por aqui falei do que acho as debilidades de transição defensiva do Benfica que depois se refletem na organização recuada que falha muitas vezes o reposicionamento certo. Já tinha sido nos jogos anteriores. Foi, claro, mais evidente contra o adversário mais forte. Um problema do processo coletivo aplicado a estes jogadores.
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Marega: dupla ação
Duas vezes isolado com o guarda-redes, correndo com a bola, profundidade ganha, com tempo para pensar. Na primeira, desastrado, atirou ao lado. Na segunda, preciso, bateu no poste e entrou. O mais curioso? Em ambas reagiu igual. Sereno, sem exuberância. Coçando ou apontando a cabeça. "Bang Marega" das duas vezes!
Famalicão: querer a bola
Cada campeonato tem as sensações das primeiras jornadas. Este Famalicão não é, porém, só um acaso de três jogos. A ideia de jogo expressa no seu 4x3x3 nota-se desde o início com jogadores que "sabem jogar" num estilo de respeito pela bola na posse e construção (quer mantendo largura, quer segurando na zona interior: muito bem o pivô Assunção, o avançar de Pote, o circular de Guga e a forma como Radic entrou). Lameiras vai (tem de) dar mais e Fábio Martins "não sabe jogar mal". Para na parte final segurar o 1-1 não teve dilemas em meter um terceiro central.
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Lino: a substituição
Vítor Oliveira quis, claro, focar o coletivo, mas a mudança ao intervalo, metendo Samuel Lino como extremo-direito, passando Laurency para a esquerda e Arthur de extremo para lateral, foi a substituição que (ligada com a reação do onze) mudou o jogo contra o Braga. Cada jogada de Lino, foi um susto para a defesa bracarense. Lino, 19 anos e um ponto conquistado com a sua marca.
Momento: o "caos tático"
O momento tático da jornada esteve quase a suceder no Marítimo-Tondela, quando a perder 0-2 aos 65", Nuno Santos passou para um 3x3x4 "sem rede". Tirou o lateral Nanu, Rúben Ferreira foi para terceiro central e meteu os extremos Marcelinho-Barrera a laterais soltos a atacar, ficando Bambock como trinco, com Cley no apoio ao trio ofensivo Maeda, Pinho e Getterson. Empatou em cinco minutos, quase fez o 3-2, mas sofreria a acabar um "penálti de pernas para o ar" que o derrotou. Um "caos tático" intencional que podia ter mudado tudo mas não será referência para próximos jogos.