Nunca me importou que chamassem filho da mãe a Mourinho cá fora, desde que eu pudesse chamar-lhe filho da mãe lá dentro, no fim do jogo. Já não me lembro da última vez
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Em 2011/12, o Real Madrid de Mourinho arrancou o campeonato ao melhor Barcelona de Guardiola com um recorde espanhol de 100 pontos e 121 golos. Saiu da Liga dos Campeões, nas meias-finais, a penáltis, e jogava um futebol de respostas fulminantes não muito diferente daquele que os alemães estavam a cozinhar.
Depois, nunca mais foi exatamente Mourinho. Ganhou coisas, incluindo outro título inglês, mas o génio e o rasgo perderam-se nas brumas do azedume castelhano, que lhe negou a glória merecida por esse título de 2012 contra, talvez, a melhor equipa da história e, por cima, ainda lhe colou rótulos de resultadista (naquela altura incompreensíveis) e mesquinho.
Para um intelecto como o dele, o Manchester United foi um erro de análise incompreensível, um clube doente que o fez baixar uns degraus na hierarquia dos treinadores, mais uma vez, à revelia da Liga Europa que ganhou.
O essencial, no entanto, não foram as tricas diretivas, nem os desentendimentos com jogadores, nem um discurso progressivamente defensivo que foi ganhando: o essencial foi o futebol. Genial, quase malvado na inteligência por trás da estratégia, o futebol de Mourinho viu-se bem em tantos momentos no FC Porto, depois no primeiro Chelsea, e atingiu dimensões diabólicas no Inter, talvez o melhor trabalho que lhe vi, mas após o Real não fixei mais nenhum daqueles jogos que eu acabava de ver sempre com a mesma frase nos lábios: "Filho da mãe!"
Percebo a exaltação da Conference League e admito que, de alguma maneira, recupera um pouquinho da aura do velho Mourinho. Só não estive perto, bem pelo contrário, de soltar um "filho da mãe!" no fim daquela hora e meia aborrecida com o Feyenoord. Nunca me importou que lhe chamassem filho da mãe cá fora, desde que ele os obrigasse a chamar-lhe filho da mãe lá dentro, depois do último apito, e não apenas por ter vencido. É esse o Mourinho que faz falta.