PLANETA DO FUTEBOL - A opinião e a análise de Luís Freitas Lobo.
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1 - É sempre uma questão de expectativas. Cada momento coloca-as num local distinto. Após ser campeão numa época já sem expectativas, Lage encontra-se agora na berma do precipício, na época imediatamente seguinte, que começou, por culpa do sucesso anterior, com as expectativas no máximo. É a vida de um treinador. Arrancou como expectativa para uma época inteira e, subitamente, tudo se "engarrafa" na expectativa isolada para o... próximo jogo.
Como um treinador começa a olhar para o futuro visando uma época inteira e, de repente, tudo para ele fica depende apenas do... próximo jogo
É o futebol a brincar com o sucesso de recuperar sete pontos de desvantagem e logo a seguir faz o contrário, gozando com a leveza de ter sete pontos de vantagem. Os primeiros tinham reduzido expectativas; os segundos tinham-nas exacerbado.
Assim, Lage chega ao local/momento onde, no passado, já estiveram tantos treinadores, após caminhadas de sucesso. Depende de simples 90 minutos. Como se não existisse mais nada.
2 - Honestamente, ainda não decifrei verdadeiramente o Lage-treinador no sentido reativo do termo. Ganhou quando teve o "toque de Midas-João Félix" e uma forma de jogar com a dinâmica ganhadora coletiva-individual em piloto automático criado por ele e nunca mais lhe tocou. Ela parecia andar sozinha.
Esta época, buscou "clonar" a ideia sem os "jogadores de Midas" e o piloto automático encravou na falta de capacidade de dar respostas diferentes às perguntas diferentes que o jogo passara a colocar. Nunca logrou criar um sistema/princípios de jogo alternativo consistente. Perdeu jogadores que o podiam catalisar (por exemplo, rumo ao 4x4x2, Raúl de Tomás não foi aproveitado, ou não se deixou aproveitar) e, assim, as expectativas cresceram para perceber até onde ele também seria um treinador reativo, capaz de (reagir), dar novas soluções táticas à equipa.
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3 - Para equipas grandes, em ambientes explosivos, dez jogos sem "respostas certas" são uma eternidade. Ao não encontrar outras "estradas táticas", Lage arrisca perder esta época muito do campeonato anterior. Ou seja, o seu problema, hoje, não é só a fragilidade com que está no banco do Benfica. Todos os treinadores passam por isso. É a fragilidade com que fica o seu sucesso anterior e a exposição excessiva em que fica neste fracasso iminente. A crueldade de, sendo ele tão igual em situações de equipas tão diferentes, o seu nome ficar em cada época metido na frase "ganhar apesar de", como na frase "perder por causa de". Fica treinador duma resposta só.
É cruel, mas, no futebol é possível perder agarrado a uma ideia antes ganhadora. Como se o "futebol de clones" fosse uma ideologia. Não é, obviamente. Porque os jogadores são todos diferentes.
O critério necessita de técnica
O Boavista de Daniel Ramos é uma equipa competitiva que tem passado por vários "estados táticos". Quis começar por se abrir de mais (para marcar a rutura com Lito) e a certo ponto recuou para voltar a fechar-se. Nesta retoma, os jogos com Moreirense e Braga voltaram a mostrar essa personalidade híbrida que a leva a hesitar em como... atacar (porque a defender, num processo que vem desde início da época, é a terceira defesa menos batida do campeonato, algo notável para uma equipa de dimensão média como é este Boavista).
O jogo de Braga foi mais uma passo de afirmação ofensiva (na pressão e bloco médio-alto sem bola) ao mudar o duplo pivô à frente da defesa. Em vez duma dupla "mordedora" como Obiora-Ackah, jogou uma complementar, com Idris a trinco e um jogador mais tecnicista na saída, Paulinho.
Na frente, surgiu Bueno, solto, vindo da ala, a criar entre linhas. Embora sendo um jogador de intensidade baixa (daí falhar o salto para um grande) tem um nível técnico que faz a diferença na fase de definição ofensiva (com um n.º9, Cassiano, que mesmo vendo pouca baliza nunca dá uma bola por perdida). Assim, ganhou bem o jogo, pelo campo todo. Mantendo a segurança, aumentando a criação tecnicista.