O Brasil não quer portugueses: quer europeus
A oficialização de Vítor Pereira no Corinthians detonou mais uma bomba de espanto e até xenofobia, mas não há mistério. Os clubes europeus querem modernizar-se sem precisarem de tradutor
Corpo do artigo
António Roque Citadini, conselheiro vitalício do Corinthians, encontra uma explicação para "esse fetiche de contratar técnico português": eles, os portugueses, "jogam melhor com os empresários". Roque Citadini sabe do que fala. Em 2009 foi acusado de receber subornos da empreiteira Camargo Corrêa, enquanto presidente do Tribunal de Contas de São Paulo, e escapou à cadeia por causa de um erro burocrático.
Citadini joga bem com empreiteiros, ou seja, nas suas próprias palavras, submetendo-se aos interesses destes, como (ao contrário dos brasileiros) os treinadores portugueses se submetem aos interesses dos empresários "para trazer jogador, para vender jogador". Este foi um dos muitos recados de boas-vindas que acolheram a notícia da contratação de Vítor Pereira pelo Corinthians. Na condição de desprezado pela Camargo Corrêa e por todos os restantes construtores civis do planeta, a minha explicação para o "fetiche" parte da ingenuidade. Os clubes brasileiros não querem treinadores portugueses, em específico: querem europeus. Aos portugueses cabe a extraordinária coincidência de serem os únicos europeus que falam português.
Essa abertura do futebol brasileiro ao exterior é inteligente. Não estão na vanguarda do jogo há décadas. Desse relacionamento só têm a ganhar, porque, na pior das hipóteses, acabam a despedir o 9876º treinador. Já as vantagens destes últimos são duvidosas. As probabilidades de êxito no Brasil são baixas, a crítica é muito violenta, xenófoba, os presidentes têm o dedo leve no gatilho, a Europa está a borrifar-se para os currículos construídos na América do Sul e tenho dúvidas de que esses façam diferença até para os "grandes" nacionais. O risco é todo dos treinadores.