A Seleção joga mal e Fernando Santos tem responsabilidade óbvia, mas construiu-se à volta dele uma fábula para vender uma ideologia futebolística que também vai dar ao play-off. Ou perto, no caso espanhol.<br/>
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Ouvindo e lendo a torrente de análises profissionais ao desastre recente da Seleção Nacional (incluindo as minhas, claro), ficamos com a ideia extraordinária de que o futebol é uma ciência exata.
Pondo-me na pele de advogado do diabo (ou do catequista, para ser mais correto), vejamos o que há de verdade no que se diz sobre o selecionador Fernando Santos.
Por exemplo, não joga um futebol ofensivo e não ganha às maiores seleções. Ora, não só é um facto que ganhou mais jogos oficiais às equipas do atual top-10 europeu* do que qualquer antecessor como, na verdade, tem um saldo positivo com cinco, neutro com duas (França e Espanha), e negativo apenas com Alemanha e Bélgica (que só defrontou uma vez cada). O saldo total é de 10 vitórias, quatro empates e quatro derrotas, 25 golos marcados e 17 sofridos.
Também se diz que jogou para o empate e que foi defensivo nos dois Europeus. Facto: só três seleções do top-10 venceram mais jogos (Itália, França e Bélgica) nos Euros"16 e 20 e só quatro marcaram mais golos. Portugal fez 14 e o máximo foram os 19 de Itália. Outro raciocínio notável: no Euro"2020 já se estava mesmo a ver no que ia dar. A Seleção Nacional foi eliminada por uma Bélgica ultradefensiva num jogo em que fez 23 remates contra 6. Os belgas fizeram 28 alívios contra nove. A menos que Santos tenha pretendido imitar essa Bélgica, a equipa derrotada no domingo pela Sérvia foi tudo menos a seleção portuguesa de três dos quatro jogos do Europeu (dentro do que dizem os números, porque opiniões e gostos temos todos).
Isto quer dizer que a Seleção está bem? Nem perto, mas o futebol não é um cabeleiro em que se escolhe o penteado por fotografias alheias. Se dependesse dos nazis do futebol único, Portugal estaria a jogar como Itália e Espanha, as misses fotogenia do Euro"2020. Por coincidência, Espanha esteve a um cabelo de falhar o apuramento direto para o Mundial no domingo, com a Suécia, e os fantásticos italianos (sem ironia) vão partilhar o play-off com os portugueses. Sabem porquê? Empataram 0-0 na Irlanda do Norte. Fizeram 12 remates.
*Com a Croácia, vice-campeã mundial, no lugar da seleção inglesa