SENADO - Um artigo de opinião de José Eduardo Simões.
Corpo do artigo
Passado apenas um ano sobre a saída turbulenta de Bruno de Carvalho a equipa do Sporting iniciou a época 19/20 mantendo apenas 8 atletas "resistentes" à invasão de Alcochete, dos quais só Coates, Mathieu, Acuña e Bas Dost eram titulares indiscutíveis. Passado outro ano e já só o capitão Coates se mantinha e continua hoje a ser a grande referência.
Do Benfica de Lage da época 19/20 foram "aproveitados" 10 (em 30) na seguinte, número que se reduziu para 8 em 21/22, dos quais 3 são titulares habituais e outros 2 jogam com alguma (ir)regularidade. Tal significa que a taxa de desaproveitamento foi de 75% no Sporting e 70% no Benfica, o que mesmo tendo em conta os efeitos de Alcochete é de bradar aos céus e diz muito sobre políticas desportivas erráticas e influência das mudanças de treinadores. Haverá algo mais em comum? O treinador leonino em 2018 era Jesus que regressou ao Benfica em 2020. Agora que saiu está em curso uma espécie de "PREC" 2 (processo de renovação especial de Costa presidente) que - vale uma aposta? - reduzirá rapidamente o leque de contratados no "PREC" 1 (processo de reforço extraordinário de Costa vice).
Estes casos são paradigmáticos de um ponto fulcral que os nossos dirigentes esquecem facilmente: a estabilidade da principal equipa, que deve ser construída a partir de um núcleo central forte que se mantenha por várias épocas, complementado por rotações e renovações normais que, em termos de objectivos, se pretende que melhorem o futebol praticado e os resultados desportivos. Esta foi, desde há 40 anos, a força estratégica que determinou o sucesso do FC Porto, e é estranho que os rivais não entendam este princípio e como caem os resultados quando não é seguido. Para além da estabilidade, percepciona-se a vontade de esconjurar o passado recente, sendo que esta vontade de "matar o Pai" mais não é que a tentativa de inculpar os antecessores de todos os males e disfarçar os próprios erros.
No caso do Sporting e após alguns passos em falso, Varandas optou pelo rejuvenescimento da equipa, com real aproveitamento da formação interna e de jovens atletas desconhecidos ou desaproveitados de outros clubes. E apostou forte num treinador inexperiente e sem currículo, que trouxe, mais que métodos, um discurso fresco, inteligente e motivador, e capacidade de dialogar sem complicar com a comunicação social. Este tiro no escuro foi caro e até começou com alguns tropeções, mas está a revelar-se um sucesso em toda a linha. Hoje os fantasmas de Bruno e Alcochete foram exorcizados, os leões possuem identidade, objectivos definidos e trabalha-se em união para os alcançar. E as finanças estão a ficar mais saudáveis.
Talvez porque o "funeral" de Luís Filipe Vieira ainda está fresco (vamos ver se as notícias da sua morte não foram exageradas e se assistirá a uma ressurreição pascal), o Benfica está na fase de destruição da memória, da "queima" de documentos e de lançar pedras sobre tudo o que possa ser conotado com Vieira. O que não fica bem e trará resultados negativos. Jesus e os jogadores contratados não foram escolha solitária. Todos se entusiasmaram com o regresso de JJ e em particular Rui Costa que, feito presidente pelos media e sócios sem outras referências ou alternativas credíveis, logo se apressou a tirar o tapete ao treinador. Segue-se, no guião habitual, a fase de não deixar pedra sobre pedra na equipa, dando guia de marcha aos jogadores, tanto os que Jesus aconselhou como os que lhe puseram ao colo. Esta é a forma dos actuais dirigentes sacudirem água do capote, vestirem as angelicais vestes brancas da pureza e anunciarem a boa nova: agora é que é! Com este "PREC" 3 e a saída do Seixal no horizonte, o Benfica recuará 20 anos e deixará campo aberto que os rivais vão aproveitar. É a vida!