Um artigo de opinião de Ricardo nascimento
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Começou o Mundial de Clubes nos Estados Unidos — território onde o futebol ainda é um mistério e os empates são tratados com a mesma suspeita que um churrasco vegetariano no Texas.
A FIFA, com o seu habitual entusiasmo pela globalização e pelos contratos de direitos televisivos, decidiu que fazia todo o sentido realizar o torneio ali. Talvez na esperança de que um camionista do Wisconsin, ao ver o Real Madrid na televisão, perceba finalmente que o soccer não é só para miúdos com chuteiras fluorescentes e mães que gritam: “Joga com o coração, Timmy!”.
O ambiente é bonito, é verdade. Relvados a brilhar como se tivessem sido polidos por fadas e uma euforia que se deve menos ao jogo e mais ao facto de haver nachos com queijo derretido servidos em baldes.
É tocante ver os americanos a tentar gostar de futebol. Genuinamente tocante. Mas é um gostar académico, de quem está a tentar apreciar vinho biológico sem saber se aquilo é suposto saber a vinagre. Olham para o jogo com a mesma expressão com que um português olha para basebol: uma mistura de tédio e medo de parecer estúpido se fizer perguntas. É como ver ópera em búlgaro.
O formato do torneio também ajuda à confusão. O Mundial de Clubes é aquela competição que ninguém sabe muito bem quando começou, quantos jogos tem, nem se o Espérance de Tunis já foi eliminado ou ainda está a tentar sacar um empate nos descontos com um golo de barriga e 18 intervenções do VAR.
Tem clubes da Ásia, América do Sul, África e Oceânia, mas no fim, claro, ganha o Real Madrid. Ou o City. Ou o Bayern. O FC Porto e o Benfica — que todos os anos prometem a Europa em maiúsculas — olham para o Mundial de Clubes com a mesma expressão de quem vê uma maratona na televisão: parece incrível, mas ter de correr aquilo tudo já é outra história.
Mas o verdadeiro vencedor, como sempre, é a FIFA — porque consegue transformar um torneio que ninguém pediu numa montra de patrocínios com mais logótipos do que faltas assinaladas.
E, no entanto, claro que vamos ver. Há ali qualquer coisa de genuíno, de esperançoso. Um estádio cheio num país onde o futebol ainda é exótico é, no fundo, uma prova de que o mundo não pára de mudar — mesmo quando a bola continua redonda.
E pode até acontecer uma daquelas pequenas maravilhas do futebol: uma equipa desconhecida elimina um colosso europeu num relvado com nome de empresa de tecnologia.
Pode não ser a Champions. Pode nem ser a Liga Europa. Mas é futebol. Com estádios cheios, adeptos barulhentos e equipas que acreditam que vale a pena correr até ao último minuto — nem que seja só para impressionar um puto de Chicago que hoje gritou “GOAAAAAL” e já explicou ao pai que Modric não é uma marca de cerveja croata.
E isso, convenhamos, já é uma pequena vitória.