SENADO - Uma opinião de José Eduardo Simões
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As principais competições que se jogam a eliminar são as Taças da Liga e de Portugal. Quem as organiza prefere que sejam os principais clubes a disputar meias-finais e finais, em particular Benfica, Sporting e FC Porto, e mais o Braga ou outro para compor o ramalhete.
Por isso, na Taça da Liga cada um dos quatro primeiros classificados no campeonato tem o seu grupo já formatado com uma via verde ou tapete mágico que facilite o acesso à Final Four. Na outrora democrática Taça de Portugal, Fernando Gomes aprovou meias-finais a duas mãos para que um tropeção possa ser emendado. Desde que a Taça da Liga foi assim ajustada, as finais tiveram Sporting, FC Porto e Braga como participantes, e em 14 edições só por duas vezes "outsiders" (Setúbal e Moreirense) conseguiram erguer o caneco.
O panorama é idêntico na Taça de Portugal, onde Benfica, FC Porto, Sporting e Braga são os finalistas habituais e, nas últimas 16 edições, só Académica, Guimarães e Aves (no rescaldo da invasão de Alcochete) lograram vencer. Nesta época, o caminho da Final Four da Taça de Liga teve dois percalços. Sérgio Conceição exagerou a rotação de suplentes e perdeu nos Açores (parabéns ao Santa Clara) e o Boavista Boavistão surpreendeu tudo e todos ao aplicar uma senhora goleada ao Braga a fazer lembrar os tempos em que os Loureiros mandavam no futebol português.
O fosso entre receitas dos clubes nacionais acentuou-se em 2014/2016 com a entrada em cena da Altice no mercado, até então único dos direitos de transmissões televisivas. Cada um por si mas irmanados dos mesmos interesses, Benfica, FC Porto e Sporting fizeram um leilão entre a MEO e a NOS e obtiveram recompensa similar de cerca de 40 milhões de euros, com a MEO a ficar com o FC Porto, a que juntou logo Guimarães, Rio Ave e Boavista. O Braga só aceitou fechar com a NOS a troco de 10/12 milhões, valor idêntico ao Guimarães com a MEO, e o Rio Ave a obter 7 a 8 milhões. Mesmo com este grande aumento de receitas, os vila-condenses acabaram por descer de divisão, provando que ter muito dinheiro e deficiente gestão pode dar problemas.
Na base da cadeia alimentar da I Liga estão os outros 17 clubes, com proveitos de direitos de valor aproximado de 3 a 4,5 milhões, a que acrescem 50 a 100 mil euros de desempenho na classificação final do campeonato. Como é sabido, e nunca é demais repetir, em Portugal a diferença na distribuição destes direitos é a maior das principais ligas europeias, com uma proporção de 10 para 1 (no Reino Unido é 1,5 para 1, em Espanha 3,5 para 1).
O que é um facto é que o dinheiro, por muito que seja, não é o único factor de sucesso. É fundamental, claro, ter muito ou pouco faz imensa diferença. Acontece que, numa actividade que movimenta orçamentos elevados e se assume como profissional, boa parte dos dirigentes e actores de topo (directores desportivos e financeiros, quadros administrativos, gabinetes de prospecção e observação, etc) não estão preparados para os desafios, e não possuem noções básicas de boa governação, organização empresarial ou definição clara de objectiivos e de planeamento para lá chegar. No fundo, é a ilusão do dinheiro a rodos, da fama (e algum proveito porventura) e poder, de serem conhecidos e entrevistados, de conhecer gente famosa e estar ao lado dela, que fala mais alto.
Em muitos casos são os empresários e agentes que verdadeiramente mandam nos clubes, escolhendo treinadores e jogadores. A centralização dos direitos televisivos não vai resolver os problemas de fundo pois até atrairá mais apetites de gente que gosta da play station e do football manager e será facilmente tentada pelos negócios que rodeiam a bola. Ou se mudam mentalidades e competências, e o formato das competições ou, na essência, nada se alterará nem ficaremos melhor.