PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
Corpo do artigo
1 O campeonato a acabar e um prenúncio de novo ciclo atravessa muitos cenários. Não estou a imaginar um ciclo de poder do Sporting, como FC Porto e Benfica construíram, cada qual nos seus tempos e estilos (dentro e fora do campo).
Este Sporting nasceu das guerras internas ao contrário dos outros grandes que crescem contra o inimigo e motivam-se nesse confronto.
Pelo contrário, este Sporting começou a época com uma turba à volta do estádio pedindo a demissão do presidente e acaba-a com uma turba ainda maior, enlouquecida, com juras de amor eterno a uma equipa na qual ninguém acreditava no início. Ninguém? Não, há sempre alguém que resiste e na aldeia cercada pergunta: "E se corre bem?". Correu.
Cedo também cedo se percebeu que para o campeonato correr bem, algo tinha de correr mal. A eliminação europeia (que protegeu a equipa duma sobrecarga físico-competitiva para a qual não tinha matéria) e até a Taça de Portugal (numa tarde no Funchal em que tentou alterar o onze... inalterável).
2 Na hora da consagração, Amorim frisou várias vezes o peso que tirava de cima. Já falara nisso no jogo anterior, após ganhar ao Rio Ave. Falava dos milhões que tinha custado, como todos o criticaram. Teve esse peso na cabeça toda a época. Não sei até que ponto faz sentido esse sentimento (de autorresponsabilização por um negócio de risco que só lhe reconhecia valor) num mundo em que êxito e fracasso são dois impostores que caminham lado a lado conversando como se fossem velhos amigos (ou inimigos aparentes).
Esse peso até o terá passado para Paulinho, outro negócio de milhões de risco a meio da época, o "melhor ponta-de-lança português" como Amorim o definiu e quis ao ponto de invadir a sua "flash-interview" gritando-lhe "agora, já podes dizer que foste barato!". Quando Varandas o agarrou, ouviu-se gritar que "para o ano há mais" e "não vale chorar".
3 Em todos estes gestos, Amorim, o treinador que está nas conferências da imprensa como se nada daquilo fosse com ele (uma imagem bem cultivada) com sorriso de menino na escola primária após 90 minutos na berma do relvado gritando (para o relvado e banco adversário). O momento em que mais se torna a visível a pressão (ou autopressão) em que viveu toda a época. Até quando viu jogos da bancada andando dum lado para o outro, impaciente e indomável, como um... leão numa jaula.
Este é o primeiro dia do resto da sua vida no Sporting e no futebol português. Acabou o Amorim quixotesco sem curso que não deixavam treinar. Irá nascer outros saído das mais clássicas teses de confronto do nosso futebol. É impossível o nosso status produzir algo diferente. Mas, e se continua a correr bem?
A partida de Marega
Não é uma saída igual às outras. A saída de Marega significa, pelo impacto e influência que o seu estilo personifica, muito da partida da ideia de futebol com que Conceição revolucionou o FC Porto. O estilo dum avançado antes desprezado e depois idolatrado. Tinha as características de velocidade possante musculada e até o temperamento irascível, promotor de conflitos e golos, como se fosse o estilo ofensivo do onze com duas pernas.
Vai para o Al Hilal. Findaram os desejos do futebol inglês do qual em épocas passadas o clube recusou propostas em nome, mais do que do valor/qualidade do jogador, da defesa da ideia de jogo do treinador que tinha nas suas características um elemento crucial.
Não será fácil substituí-lo, nem penso que se deva pensar assim (procurar um jogador de estilo parecido, como se os clones fossem normais no futebol). O ataque de Conceição evoluiu com Taremi. Conheceu outra forma de, com eficácia, relacionar bola, jogo e golo. Marega foi um cavalo de Troia estilístico. É o tempo certo de dar o poder a mais intrusos do outro estilo.