PLANETA DO EUROPEU - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - A seleção da Escócia em Wembley, mesmo sem os grandes heróis de outrora, transporta sempre um espírito de "braveheart", coração selvagem, de sentimento nacionalista.
A Inglaterra tem hoje uma seleção com personalidade tecnicamente reinventada, de Mount a Foden, mas mesmo para um rudimentar onze escocês este nunca será (desde finais do séc. XIX) um jogo normal. Eles sabiam que tinham de ser bravos em posse da bola. Não bastava só entrar para defender e resistir. Billy Gilmour, 20 anos, pode ser, à frente da defesa, conduzindo o meio-campo, o principio dessa nova "flor da Escócia futebolística" (transfer do hino escocês que ecoava nas bancadas) onde McGinn é um médio que junta todos os pedaços táticos (e técnicos) da alma da equipa e procura-a conectar com o ataque, no qual Dykes resgata o estilo dos seus antepassados n.º 9 guerreiros destemidos. Estava lançado o 5x3x2 selvagem. Ao condicionar a saída de bola do duplo-pivô construtivo inglês Rice-Phillips, tinham o princípio de conta-estratégia perfeito para impedir a Inglaterra de dominar o centro do jogo.
2 - O pior que os ingleses podiam começar a sentir seria que a melhor forma (ou única) de ultrapassar este bloqueio escocês era através de jogadas de um-para-um que desequilibrassem o jogo/coberturas. Mais do que nos jogadores de traço moderno, Southgate apostou então no jogador com maior aroma de estilo à moda antiga: Jack Grealish. Um perfil "old school" até nas meias caídas em baixo. Conduzindo a bola como gosta a partir da sua faixa esquerda, tentou abrir espaços mas o exercito de Steve Clarke nunca tremeu.
Num cenário britânico perfeito de chuva miudinha persistente, o jogo tornou-se um clássico. O onze inglês foi sempre incapaz de aumentar a velocidade do jogo como queria. Até Kane foi substituído, impotente. Com um rigor posicional intocável, o sistema escocês defendeu cerrado numa linha de 5. Sem falhar um corte. Há jogos que têm mais de alma histórica do que tática do presente. Não se explica, apenas sente-se.
3 - O 4x4x2 sueco subiu uns metros no terreno (depois do bloco-baixo profundo contra a Espanha) e venceu a Eslováquia. Na base dessa subida, o jogo interior dos alas: o poder flanqueador de Larsson e as diagonais de Forsberg para surgir por dentro. A chave, porém, estava que nessa aparição interior, Forsberg torna-se organizador (com poder de rutura). Mais do que procurar o remate, procura o passe e a sua dupla de avançados. Poucos jogadores fazem este movimentos interior (de fora para dentro) com tanta cultura tática precisa como ele. São as diagonais organizadoras de Forsberg o perfeito diálogo individual sueco entre faixa e centro.
Sozinho em casa
Numa dedução simples pode-se relacionar o número de avançados lançados no onze com a vontade de ganhar (e capacidade dessa equipa atacar) mas o futebol não tem uma lógica tão linear. A Croácia, sublimação do futebol em posse, prescindiu dessa sua ideia e assumiu o risco de partir o jogo para vencer a República Checa ao amputar o seu meio-campo do elemento-referência de equilíbrio e início de construção (Brozovic) para jogar num 4x2x3x1 quase 4x4x2 com apenas dois médios (Kovacic e Modric).
Desta forma, deixou de controlar o jogo pela associação de passe em construção e passou a jogar mais em busca da profundidade para os quatro homens na frente (Perisic-Brekalo desde as alas, Kramaric-Rebic no meio). A consequência em campo foi evidente: enquanto dois jogavam (a dupla Modric-Kovacic, claro) todo o resto do onze... corria.
Assim, deixou de poder controlar o jogo com bola e deixou um onze checo tecnicamente inferior ser sempre taticamente superior, com Soucek em passada larga a comer o campo e Darida, adiantado como "10" do 4x2x3x1, a ter, como terceiro médio de segunda linha, o monopólio da temporização em posse.
O empate deixou as duas seleções vivas para o último jogo mas o desvio conceptual croata traiu o seu estilo. Ficou Modric sozinho em casa.