Liga dos Campeões de andebol: um exemplo a seguir
Pedro Sequeira, vice-presidente da Federação de Andebol de Portugal, membro da comissão de métodos da Federação Europeia de Andebol, presidente da Confederação de Treinadores de Portugal e professor coordenador de Ciências do Desporto em Rio Maior, opina em O JOGO sobre a atualidade desportiva
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A prestação do Sporting na Liga dos Campeões da época passada foi uma surpresa para a maior parte da Europa do andebol. Uma equipa portuguesa conseguir apurar-se para os oitavos de final era algo visto como quase impossível mas, através de enormes desempenhos e excelente atitude o Sporting foi ultrapassando diversos obstáculos. Na Taça EHF (segunda prova europeia mais importante) o FC Porto foi também conseguindo excelentes prestações, conseguindo atingir a final four, feito inédito para o andebol português. Na outra competição europeia, o Madeira SAD atingia também a final da competição. O andebol português terminava assim, ao nível dos clubes, a época 2018/2019 com uma performance notável.
Esta época desportiva iniciou com a boa notícia de que a candidatura do Sporting à Liga dos Campeões (vagas para clubes não campeões e para clubes de campeonatos nacionais de países de rankings baixos) tinha sido aceite e que assim teríamos duas equipas a participar na maior competição de clubes do mundo. Se a simples participação de duas equipas do nosso país já é um facto, por si só, de enorme relevância, os resultados conseguidos até à data continuam na senda do ano anterior, estando as duas equipas em condições de se apurarem para a fase seguinte. Pelo meio, uma vitória épica do FC Porto contra o THW Kiel na casa deste!
Orçamentos muito superiores aos dos portugueses
A participação das equipas de andebol portuguesas (principalmente as masculinas, mas também as femininas, dentro da sua realidade) nas competições europeias de clubes nos últimos anos tem sido a prova de que muito trabalho, organização, dedicação, empenho e muita paixão pela modalidade tem permitido aos clubes superarem-se e "quase" nos esquecermos das condições em que participam, quando comparados com os seus adversários. Só para terem uma ideia da "desigualdade" entre clubes, no Grupo A e B da Liga dos Campeões (onde o FC Porto está inserido) há clubes com orçamentos 30x!! superiores ao do FC Porto. Alguns têm "apenas" 3x, 5x, ou 10x orçamentos superiores. Nos grupos C e D (onde o Sporting está inserido), o cenário é semelhante. Insisto, quando vemos os jogos das nossas equipas, dificilmente nos apercebemos destas questões de ordem financeira, pois a competitividade que apresentam contra todos os adversários é notável.
Parece-me que os clubes perceberam que é através das competições europeias que podem melhorar as suas condições. A continuar assim os jovens portugueses terão nos clubes portugueses excelentes condições para evoluir. Muitos atletas estrangeiros veem agora nas nossas equipas uma oportunidade de participarem nas principais provas europeias. Isto não só vai valorizar as equipas que participam nestas provas, como vai aumentar a qualidade da nossa competição interna. Mesmo as equipas que atualmente não têm possibilidades de chegar ao topo da principal competição interna beneficiarão desta transformação pois mais praticantes vão querer jogar na I Divisão, perceberão que com mais trabalho podem chegar a patamares superiores de desempenho, os jogos serão mais intensos e espetaculares, o que irá trazer mais adeptos e entidades que querem fazer parte do andebol e apoiá-lo.
Um exemplo para o feminino e as outras modalidades
Não é um processo rápido, mas nota-se já alguns desses efeitos olhando para a atual tabela classificativa da I divisão onde entre o 4.ª e o 11.º há apenas seis pontos de diferença. Isto significa oito equipas a lutarem por ficarem em três lugares que dão acesso ao grupo que vai disputar o título e o acesso às competições europeias. É importante que aquilo que se passa no masculino vá passando para o feminino. Julgo que a participação do ABC e do Benfica este ano na I divisão feminina é um bom indicador para o percurso que se também pretende para o feminino!
Que o que se passa no andebol seja seguido pelas outras modalidades coletivas do nosso país. Não tenham medo de investir tempo, trabalho, dedicação e empenho na participação nas competições europeias pois os resultados compensam. E, no final, o desporto português, no seu todo, estará certamente melhor!