PLANETA DO FUTEBOL - De projeto de futebol a sistema de negócio. Formar para vender ou para jogar... para vender? De que se fala quando se fala em formação?
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1 - De que se fala exatamente quando se fala em formação? O presente reforçou a palavra como solução para os males financeiros, mas antes ela já era utilizada com a superioridade moral por quem a dizia defender.
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Uma cantera (o "ninho dos ovos da formação") terá de ser, antes de mais, visão de captação. Identificar valores técnicos e vocação de aprendizagem de fundamentos de jogo no futuro. Prioridades de mercados de prospeção? Diria primeiro local (regional), depois nacional e, por fim, estrangeiro. Em muitos casos (clubes) vejo a ordem inversa (ou então, totalmente arbitrária). E qual o fim da formação (dentro do clube)?
O jogador da formação que sobe a sénior ou é visto como um jogador de segundo plano ou então como um fenómeno que vai partir tudo. Raramente há meio termo. E é neste que estão (quase) todos.
2 - Vejamos exemplos, como o caso espanhol e as consequências das distintas políticas de formação de Real Madrid e Barcelona. A do Real é a que produz mais jogadores para jogar na I Liga, a do Barça é que produz mais talentos para ficar com eles na primeira equipa. A mesma análise pode ser feita, a cada época, para Benfica ou FC Porto (a ordem é arbitrária) no nosso futebol. Não deteto uma linha clara através dos tempos. Para uma opção ou outra.
Recordo por 2007 estar em Espanha e ver as equipas B do Real e do Barcelona. No ataque do Castlilla, estavam Negredo, Jurado e Soldado, com De la Red, Valero, Javi Garcia ou Arbeloa atrás. Estavam no topo da tabela, enquanto o Barça B desceu de divisão, num onze donde surgiriam Busquets, Thiago Alcântara ou Pedro, que seriam orientados, na III Divisão, por Guardiola no primeiro ano como treinador. O Real contratava craques mundiais e complementava com a cantera. O Barça formava jogadores para si mesmo. Os do Real seriam mais multifuncionais a adaptar-se a qualquer estilo. Os do Barça já nasciam para um estilo de jogo especifico.
3 - O problema maior é que no Real não existia espaço para esses multifunções. Porque estavam Ronaldo e Kaká, mas também estavam Gago e Drenthe. Os miúdos da formação têm muito de mimetismo e, por isso, o Barça soube ir formando nº6 pivots uns atrás dos outros. Os do Real copiavam Ronaldo, algo impossível enquanto referência de formação tal é o fenómeno individual. No global, a I Liga enche-se de jogadores, todos diferentes, feitos no Real Madrid. Os do Barça, jogavam todos da mesma forma (adaptados a cada posição) e eram muito menos. A maioria estava (tinha espaço) no clube.
Fica a questão: ambos os clubes fazem formação mas quem a entende verdadeiramente como projeto de futebol/estilo e não como sistema ou negócio?
Também é disto, de negócios em potência, que se fala quando se fala em formação
Jogar para vender
Na maioria das vezes, a palavra formação é utilizada sem suporte ideológico. Claro que lançar jogadores como Fábio Vieira, Matheus Nunes ou Tiago Dantas é fantástico (embora, ao mesmo tempo, já se fale no dinheiro que as suas transferências podem dar). Também é disto, de negócios em potência, que se fala quando se fala em formação. Fala-se menos em como fazer a maturação dessa formação para a potenciar de forma sustentada, por algumas épocas, ao serviço da primeira equipa.
Dir-me-ão que isso é impossível face ao poder financeiro dos gigantes europeus. Sim, para os "Ronaldos ou craques reais" é. Os outros (a maioria) que poucas épocas depois necessitam de ser resgatados para não se perder o talento (precocemente avaliado e transacionado) foram apenas peças dum negócio que, em vez de promover a formação, mata-a mal os seus filhos saem do ovo.
Não faltam casos destes. A formação é (sobretudo) carne para canhão financeiro. Forma-se para vender, não para jogar (este é só pelo tempo necessário para vender). Duvido que estes tempos mudem o paradigma.