A seleção Sub-21 é única no futebol português. Não depende de individualidades, não se rege por questões físicas, não tem dogmas estilísticos
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1 - A seleção Sub-21 não se parece com nada no futebol português. Não faz depender o seu jogo de individualidades, não filtra qualidade por questões físicas, não tem dogmas estilísticos.
Dá prazer ver jogar uma equipa sem medidas "standard"
Dá prazer ver jogar uma equipa sem medidas "standard" exaltando, ao invés, o critério de respeito pela bola num futebol associativo de passe criativo e mobilidade. Variando o valor das gerações, Rui Jorge vem promovendo este tipo de futebol e multiexpressão de traços dos jogadores desde o seu primeiro dia na seleção.
Muitas vezes, esse processo é feito sem o acompanhamento dos clubes (mutantes na relação com o jogador Sub-21 em função da política desportiva ou das opções de estilo e do treinador da equipa principal). Não é, no entanto, obrigatório que os clubes tenham igual sensibilidade. Cada qual concebe o seu projeto de futebol em relação aos produtos da sua formação. A seleção tem de viver acima disso, com uma ideia supraglobal. E é o que faz. A sucessiva qualidade competitiva e sedutora do seu jogo prova como está certa nessa opção.
2 - No onze que defrontou a Croácia vê-se a apetência pelo jogo interior com passes verticais (que ultrapassam linhas de pressão adversárias) dos centrais ou pivô para médios mais subidos. Tal revela, por si só, qualidade técnica notável (pela eficácia desse passes de risco e dificuldade/exigência de precisão máxima) e o assumir do jogo sem medo, com convicção plena de como se deve jogar.
Vejo Florentino a pivô n.º 6 e a saída criativa da pressão do Vitinha, n.º 8 de "roda baixa" no bom estilo histórico lusitano, e vejo o nosso futebol. O Vitinha tem técnica e olhos por todo o corpo. Tem de jogar mais. Não pode passar a época quase toda no banco do Wolverhampton.
São estes os exemplares-essência do nosso futebol (de que adianta engrossar fisicamente um jogador se ele depois não sabe passar uma bola?) junto com a expressão de técnica combativa do Tiago Tomás na frente de ataque. Todos dialogam futebolisticamente uns com os outros em posse de bola. E, atenção, são na mesma... intensos sem ela na transição defensiva.
3 - Nesse contexto, Fábio Vieira renasceu para o seu futebol com um golo de classe, jogando como interior solto, quando Rui Jorge já tinha redesenhado o onze. Entre eles, Dany Mota, na casa n.º 9 a saber jogar em apoios. Mais difícil é o encaixe de Pedro Gonçalves a partir duma ala em 4x3x3. Sei que já jogou nessas bandas em Famalicão, mas uma coisa é poder recuar e receber de frente para o jogo e outra é jogar mais adiantado, marcado em cima entre linhas e receber quase sempre de costas. A sua quebra no Sporting também tem a ver com isso.
Desencontro conceptual
Independentemente da valoração que se faça de cada talento saído da formação portista (a geração da Youth League de Fábio Vieira, Baró e Vitinha a Tomás Esteves, Afonso Sousa e João Mário) é factual o desencontro conceptual entre as linhas caracterizantes do jogador da formação e a tipologia do jogador, mais intenso na dimensão física do jogo, preferida pelos responsáveis da equipa principal.
Não se trata de quem tem razão, porque são diferentes opções e formas de pensar. O preocupante para o status interligado do futebol portista é existir esse desencontro. Sei que esses jogadores têm tido minutos na equipa principal mas a forma como saem depois dela é mais produto de valorações de comportamentos perante o jogo que exige uma maturação e consciência competitiva muito distinta dos parâmetros com que cresceram (e nem a podem ter já, com consistência, num nível mais alto). Mais preocupante (até para a autoestima motivacional decisiva na maturação da formação) será sentirem-se responsáveis por um insucesso coletivo (num jogo em que foram aposta no onze).