Fábio Silva é um adulto sem gravata na equipa do FC Porto
PLANETA DO FUTEBOL - A crónica de Luís Freitas Lobo. Hoje sobre o mito dos experientes e os jovens que despontam
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1 - É um dos maiores mitos na avaliação das equipas. A importância dos "jogadores experientes". Falo, atenção, no jogo, onde o mesmo erro é justificado por um jogador ser jovem ou a mesma boa jogada-artimanha é elogiada por o jogador, com mais idade, ser "experiente".
Nunca o vejo com medo de falhar, a hesitar. Vejo-o sempre destemido, crente que vai acertar, e arrisca
Diferente, claro, é no balneário, onde é decisivo ter "homens" (como gosto de chamar aos... experientes) que apontem o dedo a qualquer outro. É liderança. No jogo propriamente dito, porém, as coisas podem ser diferentes. Existe a liderança do caráter do experiente a quem até o árbitro por vezes "baixa as orelhas", mas quando chega o momento decisivo do jogo jogado, a palavra chave é outra: qualidade! E essa, aos 20 como aos 30, ou tens ou não tens, para marcar a diferença. Pode o defesa central "experiente" que grita ser um e o que joga mesmo ser outro, o miúdo a começar.
2 - Este campeonato está a dar exemplos disto. Há dois em que penso para combater o mito do jogador experiente em detrimento do jogador jovem: Nehuén Pérez, 19 anos, do Famalicão, e Tapsoba, 20 anos, do V. Guimarães, centrais que estão a dizer como se joga, com serenidade, eficácia e personalidade. Nunca se cresceu tão rápido como agora no futebol. É a qualidade a responder à urgência das necessidades e a não falhar.
Pérez já tem pedigree das seleções jovens argentinas até os sub-20 e só é possível estar em Famalicão, emprestado pelo At. Madrid, pelo projeto de investimento existente no clube. Tapsoba apareceu em 2016 na seleção do Burkina quando, com 17 anos, ainda jogava no Ouagadougou do seu país, chegou a Guimarães e percorreu a equipa B (por vezes a terceiro central à esquerda numa estrutura a "3"). Hoje, o seu 1,90 m afirma-se na primeira equipa e nas duas... áreas.
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3 - O corte de Peréz, nos últimos minutos, à entrada da área, num takle preciso sem ter de deslizar no chão (o que daria inevitavelmente falta), sem osso, só bola, desfazendo um ataque do Sporting e lançando o contra-ataque famalicense para o golo da vitória, mostra a sua personalidade feita qualidade (ou vice-versa, também funciona). E até a forma como se ergueu depois do corte, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Não faz sentido, no futebol atual, essa divisão experientes-jovens como fator de avaliação por princípio. Na posição, a do defesa, onde a consequência do erro pode ser fatal para a equipa, eles dizem isso a cada jogo que passa. Para os avançados esta tese do erro e suas consequências é diferente (porque elas podem ser só uns assobios e a seguir volta a tentar). Para o defesa não. A qualidade é o único fator que conheço de avaliação. E crescer rápido... por dentro é um sintoma disso.
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Reviver a infância
A alegria de Fábio Silva a jogar na primeira equipa do FC Porto é de jardim infantil. Não encontro melhor elogio para lhe fazer. O futebol como forma de reviver a infância todas as semanas, como escreveu sublimemente Javier Marías.
Ainda se precipita em muitos lances, até na ânsia da receção e de querer decidir rápido e bem, mas tem dentro dele o mais importante, no plano da qualidade técnica, movimentos pensados (que podem crescer muito em fundamentos de jogo) e, sobretudo, a autoestima que se sente de acreditar sempre em si a cada jogada. Ou seja, nunca o vejo com medo de falhar, a hesitar. Vejo-o sempre destemido, crente que vai acertar, e arrisca. Remate ou finta.
Esta é um época para descobrir um "admirável mundo novo". Adulto sem gravata. Só perceber o "outro futebol". O tal que existe para além do parque infantil. E entretanto ir crescendo. Descoberta guiada, com o treinador, colegas e treino em três dimensões (mental, tática e técnica). O físico? Deixem-no em paz.
Nota: em relação à eleição de Messi como jogador FIFA do ano, só uma palavra: normal!