Paulo Faria, antigo internacional A de andebol e ex-treinador escreve para O JOGO.
Assisti, incrédulo, aos argumentos negacionistas de um deputado na audiência na Assembleia da República sobre a urgência de promover a retoma da atividade desportiva dos escalões de formação, em que, e com muita competência, o presidente da Confederação dos Treinadores de Portugal, Pedro Sequeira, se manifestou, justificadamente, preocupado com "mais de 300 mil jovens que não conseguem praticar qualquer atividade", alertando que isso terá "consequências sérias no futuro".
"A incompetência e ignorância dos nossos políticos não os deixa ver aquilo todos devíamos saber"
Sei que para se ser deputado chega fazer parte de um partido, não se precisa de um currículo nem tem que se justificar qualquer incompetência.
Num momento tão delicado para os nossos jovens, estes deputados, incompetentes e impreparados, opinam de forma quase leviana sobre a importância de manter os jovens sem a prática de atividade física utilizando a capa da não propagação do vírus covid-19.
Este momento demonstra a importância que a atividade física NÃO TEM no desenvolvimento da nossa sociedade para os nossos deputados, e que as decisões políticas assumem, sem o afirmarem, que "mente sã em corpo são" é uma miragem em Portugal.
Já agora, no Portugal do Cristiano Ronaldo, do João Almeida (4.º da geral no Giro!), do Jorge Fonseca (campeão mundial de judo), do Miguel Oliveira, a dar cartas na MotoGP, do Gilberto Duarte, que coloca o nosso andebol ao mais alto nível, jogando no Montpellier, de França, mas já tendo passado pelo Barcelona... do Portugal cuja Seleção Nacional de andebol, em janeiro, alcançou a melhor classificação de sempre num Europeu (sexto lugar) e cujas seleções de sub-19 e sub-21 foram quartas nos respetivos mundiais.
Uma sociedade desenvolvida jamais permitiria, na sua estratégia de desenvolvimento, a quase total paragem da prática do exercício físico a tantos e tantos jovens.
A somar a esta assustadora incompetência, está o facto de assistirmos a dois pesos e duas medidas - mais incompetência - para os nossos jovens, uma vez que uns já reiniciaram os treinos, porque têm instalações próprias, e outros - em que a prática seria feita em instalações escolares pagas por todos nós - , que estão sujeitos às decisões de cada agrupamento escolar, e que por ausência de orientações superiores criam situações caricatas como o facto de haver escolas que permitem a utilização das instalações depois das aulas outras que nem assim permitam.
São estes últimos diretores escolares que me assustam, porque, supostamente, deveriam ser altamente especializados no desenvolvimento integral dos nossos jovens, e ao decidirem não abrir os "nossos" espaços dão um sinal aos pais do tipo de projeto educativo que (não) têm. E nestes eu jamais colocaria um filho meu.
Depois temos um país dividido: enquanto na Região Autónoma da Madeira, e muito bem, já recomeçou inclusive a competição jovem, no Continente temos pavilhões fechados por decisões individuais de diretores escolares e nem os treinos se reiniciaram.
A Organização Mundial da Saúde alerta que levar uma vida sedentária a partir de idades tão precoces faz com que "os jovens tenham pior saúde respiratória, cardiovascular, pior qualidade óssea e menor probabilidade de manter o peso recomendado". Uma sociedade moderna, esclarecida e preocupada sabe isto, mas a incompetência e ignorância dos nossos políticos não os deixa ver aquilo todos devíamos saber.
Gostava de ver a nossa Federação assumir um papel de liderança na contestação a esta decisão absurda, que vai prejudicar o país a todos os níveis, e que o nosso presidente, dr. Miguel Laranjeiro, que já foi deputado, não descansasse enquanto se mantiver vedada a prática de exercício físico aos nossos jovens.
Para isso, é urgente sair do politicamente correto porque os nossos jovens não merecem tão más políticas.
