É um conto de fadas ver jogadores estrearem-se com 16 anos, mas pode ser perigoso
PLANETA DO FUTEBOL - Opinião de Luís Freitas Lobo
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1 - O jogador de futebol cada vez nasce mais cedo. Está agora a disputar-se um Europeu Sub-21 mas muitos desses potenciais craques nessa idade não estão presentes porque já estão inseridos nas seleções maiores.
Qual a idade chave para dizer que estamos face a um craque?
Olho para muitos desses jogadores e penso em que idade se pode ter a certeza que estamos mesmo perante um talento diferenciador (um craque que vai marcar a sua geração) e não apenas face a mais um exercício de imaginação de talento precoce.
Penso em jogadores como Foden, João Félix, Maddison, Odegaard e chego até Grealish. Eu sei que são jogadores diferentes em fases distintas das suas carreiras mas todos me fazem pensar em como após a formação nas camadas jovens segue-se um período mais difícil a que chamo a maturação da formação. É uma fase indispensável tantas vezes ignorada ou subvertida pela ânsia de fazer talentos excecionais cedo demais.
2 - É um conto de fadas ver jogadores a estrearem-se com 16/17 anos numa equipa sénior mas, após o deslumbramento, fico mais com a sensação de como isso pode ser perigoso. Estão a saltar-se muitas etapas naturais de crescimento. Sobem-se expectativas e pressões adicionais. Poucos jogadores nessa idade têm estrutura (mental-futebolística) para a suportar.
Grealish é um jogador que adoro. Está com 25 anos, a carreira toda no Aston Villa, como um n.º 10 livre. Finta, pode ir rápido, ou abrandar, organiza e remata. Atinge agora a sua maturidade plena mas durante anos após prometer tanto, o seu nível como que estagnou e desapareceu. Parecia vir a ser apenas mais um bom jogador utilitário. O craque continuava dentro dele. A sua maturação, porém, falhara o timing certo. Agora, aparece mas pela natural evolução do conhecimento (do jogo e da afirmação da sua personalidade) e dotes técnicos inatos.
Foden, 20, é mais direto como goleador e Maddison, 24, um n.º 10 entre linhas. Odegaard, 22, é um criativo "light". Félix, 21, é um segundo-avançado que meteu Simeone na carreira em pleno crescimento e isso foi um choque pelas exigências tático-defensivas que lhe criou.
3 - Mas existe uma idade certa para cada etapa de formação, maturação e afirmação de um jogador? Sem bases científicas, mas com bases de perceção futebolística, diria que entre os 17 e 20 anos é tentador detetar logo o talento nos que mais se destacam. Devemos estimulá-los a todos mas ao chegar aos 21 percebe-se como alguns travam e outros têm potencial para seguir para esse nível alto.
Depois, aos 23 surge outra separação, mais decisiva: os que seguem mesmo para o nível "top" e os que ficam no patamar inferior. É quando se pode dizer que estamos perante um craque. Não é fácil dizer isso com certeza porque muitas das qualidades que fazem um craque estão escondidas. Penso na motivação, nível de superação, capacidade de aprendizagem, personalidade. Tudo isso tem de caminhar, no mesmo nível, ao lado das qualidades técnicas.
Nesse momento existe a estabilidade do talento. Passar dum bom jogador para um grande jogador. É para onde vão Félix ou Foden. Não sei se irá Odegaard, duvido. Sinto que Grealish devia ter tido essa exigência e Maddison necessita testar-se a essa nível. Aos 26/27 estarão no auge da sua carreira.
4 - Há, no entanto, jogadores/talentos que fazem pensar no saltar destas etapas. Ouço Wenger falar sobre esta formação do talento e questiona-se como ele podia saber que Fàbregas tinha tudo isto aos 17 anos? Foi de Barcelona para o Arsenal e logo mostrou a motivação da "performance". Isso foi decisivo para esse crescimento acelerado no tempo. Pode debater-se sobre a urgência do crescimento físico por entre a natureza morfológica-técnica do jogador mas Fàbregas (talento e motivação) driblou tudo isso. Poucos têm, porém, as forças que ele tinha. A ansiedade em detetar talentos quando muitas vezes eles mal aprenderam a andar fora do berço da formação tornou-se um túnel demasiado escuro para muitos atravessarem.