PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
Corpo do artigo
1 A pergunta do titulo é, naturalmente, um exercício imaginário e utópico, talvez até profundamente disparatado, mas ela assaltou-me ouvindo Paulo Sérgio e Sérgio Conceição (atual e anterior treinador de Nakajima nas últimas épocas) a falarem dele, por estes dias.
Paulo Sérgio falou mesmo após ganhar um jogo em que o japonês baixote inventara uma série de lances e passes dos seus. Quando, porém, lhe falaram disso, logo tirou-lhe o foco de cima porque "o futebol é feito de quem toca violino, mas também de quem toca bombo. Não é feito só de Nakajimas".
Aqui o nome do japonês já se tornara mesmo (os "nakajimas") num adjetivo tático-futebolístico para definir o jogador violinista da técnica, mas que praticamente não existe nos outros momentos do jogo (a defender) e que quase não reage (encolhe os ombros e siga) quando falha (como sucedeu nesse mesmo jogo) um desses seus passes de risco e travessura, deixando a equipa descompensada na transição defensiva que tem de ser sempre rápida e de reação coletiva imediata.
2 Conceição foi mais curto e na antevisão ao jogo (no qual o japonês não pode jogar) disse que o tem visto no Portimonense, que está num "bom nível" mas "num contexto diferente", referindo-se em comparação ao que tinha no FC Porto. Esse contexto está, para além da dimensão competitiva-emocional entre equipa grande e equipa média/pequena, também relacionado com a participação no "jogo todo" e não só nos momentos lindos de bola no pé.
3 Em tese, uma equipa grande até podia mais facilmente ter um jogador desses do que a pequena (que, por natureza, passa mais tempo a defender) mas o futebol não é assim tão linear.
É que na equipa grande, essa burguesia não pode ser reivindicada só por um porque se está meio de tantos outros jogadores com a mesma (ou maior) capacidade de definir por eles próprios o jogo, enquanto que na médio-pequena essa casta de jogadores é rara (todos têm, por principio, de começar com um bombo e só depois pegar num violino, mas com cuidado para não estragar o resto da orquestra-equipa com esse individualismo). Ou seja, nessas equipas/contexto, essa diferença individual isolada ganha mesmo jogos. E o resto da equipa sabe disso.
Na equipa grande é ao contrário, não faltam talentos para decidir jogos. Mais difícil é (reparem as criticas que, por vezes, Conceição faz à equipa) ter o tal compromisso coletivo (sem exceções) para todos participarem em todos momentos do jogo, reagindo à perda e depois poder fazer a diferença pós-recuperação.
Em suma, respondendo à pergunta inicial, diria que o futebol se tornaria numa Disneylândia de técnica que nos faria rir muito, mas iria, num ápice, fulminar o coração cheio de quadros táticos de qualquer treinador.
O vírus salta nos cantos
O vírus, que tem andado nas nossas vidas, meteu-se no futebol quase como um intruso tático de surpresa para os treinadores à ultima hora. Sei que corro o risco de com esta frase parecer sanitariamente fútil mas, convenhamos, esta é apenas um página sobre futebol. Do verdadeiro, com onze de cada lado.
Como deve suceder no dérbi lisboeta, embora o vírus tenha apanhado a arma de golo mais imparável do Sporting: o jogo aéreo do Coates nos cantos. Sei que o Pote também inventa lances geniais mas com estratégias de marcação mais bem elaboradas, tal pode ser (pelo menos) condicionado. Agora, quando a girafa uruguaia surge na área adversária, já é quase meio-golo se a bola vier no seu perímetro de alcance e cabeceamento.
Por isso, embora Coates pareça tornar a defesa intransponível quando atrás, numa linha de três, tira tudo em bloco médio-baixo (ao contrário do passado em que lhe pediam para controlar profundidade), a sua ausência provoca ao Sporting mais danos ofensivos do que defensivos. Porque para refazer o processo defensivo (mesmo sem Palhinha), Amorim tem de ser apenas treinador e congeminar compensações. Para reproduzir o poder de jogo aéreo a atacar isso já não consegue, porque aí o jogo já não é dele. É do jogadores (e, neste caso, muito de um especialmente).