PLANETA DO FUTEBOL - Rúben Amorim, Sérgio Conceição e Jesus. As transformações obrigatórias e o novo nível de exigências. Cada qual perante realidades diferentes.
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1 Um treinador nunca é exatamente o mesmo de época para época. Mais do que a sua essência, a força das circunstâncias (a mudança de cenários) obriga a adaptações ou transformações na forma como agir, pensar e comunicar. Amorim, Conceição e Jesus são, nesse plano, três casos em planos totalmente distintos.
Para o FC Porto, a importância da manutenção de Conceição passa pela consciência de saber que, se ele sair, não sai apenas um mero treinador (como outros, mesmo com sucesso, que já teve).
Saindo Conceição, sai uma ideia e forma de estar que incorpora e resgatou o código genético da identidade-Porto quando este vivia um tempo de crise existencial.
Substituir um treinador apenas é fácil. Substituir um treinador-ADN, que faz a essência de um clube personalizada em si (e sobredimensionada num momento histórico chave), é uma missão quase impossível. Reencontrar um treinador com esse perfil iria, no momento atual, obrigar a estrutura portista a, sobretudo, olhar para treinadores que, incorporando esse perfil, já tivessem passado pelo clube.
2 Mantendo a base desta época, o Sporting irá necessitar de três ou quatro reforços de valor indiscutível para poder entrar no onze e assim fazer, sem se notar quebra de qualidade/rendimento competitiva, a necessária gestão/rotação da equipa.
Uma nova realidade que, numa visão global, também obrigará a um "upgrade" do treinador Rúben Amorim. Não se trata de mudar a sua essência. Trata-se de encarar novas pressões num percurso de crescimento natural de exigências (a todos os níveis) para ele e para o clube.
O treinador sem curso, que era olhado quase de forma quixotescamente romântica a desafiar o poder dos grandes, é agora o treinador que derrotou Jesus e Conceição. O seu discurso também terá de mudar, acompanhando uma transformação de atitude. Tudo terá de crescer nele. Até a arte do confronto com aqueles que agora já o irão ver como um alvo a abater entre iguais.
3 Já não serão mais possíveis tantas conferências com tantos sorrisos e respostas assobiando para o ar sobre resultados, candidaturas ao título ou quem joga ou não. Agora, Amorim é o treinador campeão e isso muda tudo. Será interessante ver como a sua personalidade irá lidar com este novo ciclo.
Mais do que questões táticas ou de treino, trata-se da entrada num novo nível de realidade existencial de um treinador. O crescimento tem tanto de aliciante como de traiçoeiro. Este nova ideia de Sporting, que pode surgir de todo este cenário (em termos históricos e correlação de poderes), irá crescer em paralelo com o do seu treinador.
Não sei qual nasceu primeiro. Se Ruben Amorim ou essa nova ideia de Sporting. A próxima época dará a resposta.
O espaço de Jesus
Benfica e FC Porto têm treinadores já feitos que ultrapassaram há muito esse túnel de crescimento onde entrará Amorim. O momento que o Benfica atravessa é mais delicado em função da forma como depositou no treinador toda a sua ideia de reinvenção após uma época negativa. Após perder outra vez, essa opção tornou-se uma ameaça.
Jesus já não tem espaço mental disponível para se reinventar. Nem está preocupado com isso. A sua postura, a ganhar ou perder, não muda mas, por paradoxal que seja, é quando... perde que fica melhor treinador. No sentido de que, confrontado com a derrota, tal o obriga a refletir mais sobre tudo o que o rodeia. Táticas, comunicação com os jogadores, dinâmicas de jogo, etc.
O investimento que o Benfica necessita não é, portanto, em contratar novos jogadores, mas sim em potenciar aqueles que tem e não renderam nesta época. Essa tarefa, por si só, já exige um treinador (momentaneamente) diferente. No fundo, uma cedência de Jesus ao seu ego. Colocar mais dúvidas do que viver sobre certezas ilusórias.