PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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Quantas vezes, nos momentos decisivos, ouvimos "temos que ganhar seja de que forma for"? Muitas! Mas, como funciona esse sistema?
1 É comum, quando chegam momentos decisivos e os resultados não aparecem, ouvir-se que no próximo jogo "temos que ganhar seja de que forma for". Entendo, claro, a necessidade de ganhar para evitar o descalabro, mas nunca percebi o que é (e como funciona) esse "sistema-seja como for".
O natural é concluir que será jogo para não ter preocupações estéticas ou respeito pelo modelo de jogo preferencial,. Será antes para fazer seja o que for para resolver qualquer coisa no jogo, seja pontapé para a frente em jogo direto ou para a bancada a sacudir o perigo, com faltas (mais ou menos tácticas) inclusive. Julgam que assim, reagindo ao que o jogo der, estarão mais perto de ganhar, sem a preocupação perturbadora de jogar conforme os princípios de jogo que ensaiaram durante a época. Em suma: não é tempo para pensar em nada. É só para agarrar o jogo (e adversários) pelo pescoço.
2Não consigo detectar comportamento mais primitivo e irracional numa equipa de futebol. Mas, calma, existe solução de compromisso para este dilema existencial.
Recordo Cruyff, quando lhe perguntavam qual era seu plano de treino (e, consequentemente, para o jogo), responder: "Como posso saber? Eu treino conforme as necessidades". Sendo, naturalmente, objetivo desse treino a operacionalização do jogo, a resposta serviria para os dois.
Não se trata só da questão da estratégia versus identidade. Trata-se do cruzamento ente as duas. Uma união que expressa o modelar do modelo em especificidade. Usando um mundo paralelo adaptado ao futebol, não é necessário transformar um bailado numa marcha militar. O elixir estará nos fins da estratégia começarem nos princípios da identidade. Depois, esperemos as consequências.
3 Como isto funciona melhor com nomes e exemplos, pensemos nas nossa equipas. Quero desfrutar com o FC Porto e Otávio, com o Benfica e Weigl, com o Braga e André Horta, com o Sporting e Vietto. Alguns destes jogadores não estão a jogar ou são muito criticados? Posso-vos garantir que não é problema deles. De Weigl a Horta. Serão, admito, culpados de querer "outro jogo". Legitimamente, com as suas identidades.
É difícil escolher entre Danilo e Rúben Neves? Claro que sim, mas mais difícil seria, acredito, não seguir a ideia de entrar em campo com a intenção de jogar melhor do que a outra equipa. No "meu jogar", Rúben Neves teria sempre lugar. Mas, atenção, voltando ao início do texto, nunca "seja de que forma for".
Pensam que se esse jogo decisivo poderá ser como as "últimas palavras" do jogar dessa equipa, elas já não terão tanta importância. Nada mais errado. Em nenhum outro momento elas terão tanta importância.
Os fins dos princípios
Não vejam estas reflexões como lições de futebol. Era o que faltava. Ninguém melhor que cada treinador, em cada equipa, para decidir quem joga e como deve jogar. Se tem quem lance bem em profundidade e alguém na frente que segura a bola (e ganhá-la nas alturas) por que não jogar assim em vez de insistir em construir desde trás? Tudo bem, mas, atenção, não são os princípios de jogo preferenciais que se questionam. É, isso sim, a possibilidade de aplicação desse princípios. Ou seja, os princípios de jogo dependem sempre dos jogadores ao dispor. É incontornável.
Qualquer boa equipa tem de ser consciente dos seus defeitos e virtudes. Não sei onde acaba o físico e começa o psicológico. Em função disso, trabalhar e jogar como um bloco. Não acredito em ilusões. Uma equipa que quer ganhar títulos, tem de jogar bem (não confundir com ideais de "jogar bonito"). Gosto de uma alta circulação de bola e para isso é obrigatório um bom jogo posicional. A identidade será marcada pelo cruzamento entre as ideias do treinador e a características dos jogadores. Não há forma de fugir a isto.