TEORIA DO CAOS - Um artigo de opinião de José Manuel Ribeiro.
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Mais do que o combate sanguinário entre FC Porto e Benfica pelo central João Víctor, talvez importe olhar para o terceiro clube da equação, o Corinthians, condenado a ser sangrado do jogador qualquer que seja o destino.
Não acontecerá no defeso brasileiro, nem sequer no catastrófico último dia de inscrições, mas à 14ª de 38 jornadas do campeonato, com a Taça Libertadores pelo meio, e em pleno holocausto clínico.
De 26 de janeiro até agora, o "Timão" de Vítor Pereira fez 38 jogos. É uma operação de matemática simples: 38 jogos a dividir por 26 semanas resulta em 1,46 partidas por cada sete dias. Em novembro, quando a época expirar, o total poderá rondar os 70 jogos. Enquanto enfrenta estes calendários do demo, o Corinthians vende uma média de quatro titulares por ano, às vezes mais, para cinco ou seis mercados e janelas diferentes. Em 21/22, dois saíram em janeiro, outro em março e o último em junho.
Num artigo que me chamou a atenção por ulteriores motivos (já explico), o presidente da Associação Nacional de Agentes escreve no "Record" que "o futebol português é scouting, formação, vitrine [vitrina, na verdade] e venda". "Só assim", afirma, "o futebol português pode sobreviver." Sem discordar completamente disso, diria que, antes do futebol português, quem não sobreviverá são os agentes a que Artur Fernandes preside, ou pelo menos viverão muito melhor com "scouting, formação e vitrine" do que com scouting, formação e "equipes" competitivas. Esses agentes são da mesma estirpe dos que, com o aforismo da "liga vendedora" na ponta da língua, fizeram do Brasileirão o campeonato do caos e da balbúrdia que a situação do Corinthians descreve.
Não ataco os agentes. O futebol seria sempre péssimo se qualquer das suas classes pudesse dirigi-lo sozinha. Se fossem os treinadores, os jogadores teriam antenas na cabeça e sofreriam eletrochoques quando hesitassem no pressing. Se fossem os jogadores, haveria mercado todo o ano e os contratos seriam escritos em papel solúvel. Se fossem os árbitros, o futebol seria mudo. Se fosse o público, as estrelas teriam vínculos de cem anos, sem hipótese de rescisão. Se fossem os jornalistas, nos balneários só haveria paredes de vidro. Mas quando um agente, perdão, um presidente dos agentes fala na venda dos miúdos da formação (até aqui "nem sequer considerados") como "a salvação das SAD" e condena as cláusulas de rescisão "abusivamente elevadas, nada conformes com a proporção dos salários dos atletas", penso no paraíso que seria um futuro brasileiro para Portugal. Um sítio onde as cláusulas de rescisão respeitassem "a proporção dos salários dos atletas", mas onde as comissões dos agentes continuassem a não precisar de o fazer.
Sabem quantos anos de salário de Vitinha e Fábio Vieira (juntos) cabem nos 10 por cento de comissão das suas transferências? Doze e meio. Cinquenta se considerarmos o salário de diplomata (10 mil mensais), que é o mais alto da função pública.