Fernando Santos, o herói de 2016, foi ao castigo ouvir um jornalista perguntar-lhe, na TV nacional, quando é que se reforma. Resignou-se e fez a vontade ao povo.
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A Seleção Nacional tem, de facto, um problema sério quando um jornalista acha razoável perguntar ao selecionador se Cristiano Ronaldo confia nele.
A entrevista a Fernando Santos, na TVI, pareceu o equivalente a uma sessão de reguadas na escola primária, a que nem sequer faltou a pergunta "mas quando é que vai para a reforma?" Significa que, de 2016 para cá, o rei que Fernando Santos teve o mérito de expulsar da barriga dos portugueses já voltou lá para dentro, mas mais gordo e muito mais presunçoso.
E isso nada tem a ver com o 4x3x3 ou o 5x3x2, como saberá qualquer pessoa que se entretenha a ler a Imprensa estrangeira sobre as respetivas seleções. Depois da derrota na primeira final disputada por Inglaterra em 55 anos, no Euro"2020, valeu tudo, do achincalhamento do selecionador até atos de racismo contra jogadores. Nenhuma seleção no mundo goza mais do que uns dias de paz entre meses de críticas violentas, jogue como jogar. Em 1998, assisti a trocas dos piores insultos imagináveis entre jornalistas brasileiros e o selecionador Mário Zagallo, quase a chegar a vias de facto.
Uns tempos antes, um programa de humor lançara um sketch em que um ator o interpretava a ter um enfarte: "Parreira, estou tendo um ataque cardíaco". O ator com o papel do adjunto Parreira respondia "ataque não, Zagallo, defesa, defesa de coração." Zagallo fora campeão mundial em 1970, adjunto no título de 1994 e seria finalista em 1998, com uma seleção estratosférica. Ficara, ainda assim, cumprida a promessa que fizera aos brasileiros, exaltado, no último jogo do apuramento sul-americano: "Vocês vão ter que me engolir!" Ontem, um Fernando Santos combalido pela erosão destes dias foi à palmatória da TVI fazer a vontade ao povo e dizer o mesmo, mas na versão do derrotado. Não terão que o engolir.