PLANETA DO FUTEBOL Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Produzida numa galáxia distante do futebol meramente terreno, a Liga dos Campeões fala a verdade do "futebol milenar" que, duma forma ou outra, caminha cada vez mais para ser uma competição fechada.
Sem fazer o mesmo ruído, todos os traços da "Super Liga" estão dentro desta elite. Fica a ténue abertura que a primeira fase ainda dá ao "velho futebol" (tirando dívidas de poder criadas) de entrar nessa galáxia.
É, por isso, uma proeza o futebol português, no contexto que atravessa, conseguir meter três equipas nesse (quase) clube privado futebolístico-faraónico.
A proeza cresce vendo como ultrapassámos no "ranking" os clubes franceses, realidade virtualmente aumentada pelo PSG, um fenómeno árabe fora do real contexto do futebol francês que, verdadeiramente, só mete uma equipa (o campeão-Cinderela Lille), mostrando como todo o seu futebol de clubes perdeu competitividade nas últimas épocas.
2 A capacidade de FC Porto, Benfica e, agora, o Sporting em busca de solidificação de igual estatuto, se meterem, ciclicamente, nesta elite por direito próprio é quase como um grupo encapuçado (de gestão e plano futebolístico) assaltar um banco iludindo todas as regras de seguranças existentes.
Podemos, depois do sorteio, sentir que somos como a "casa de papel" do futebol europeu mas, num paralelo cine-desportivo, essa personagem coletiva assenta na perfeição ao nosso futebol a entrar, insolente, nesse edifício dos poderosos. Ninguém nos pode impedir, agora, de (jogo a jogo) roubar o cofre-forte. E fugir com ele.
3 As discussões semanais do nosso campeonato enchem o imaginário do futebol de café (com clones televisivos) mas onde se fala mesmo verdade para o futuro do futebol português é fora dessa cave existencial.
Para os nossos clássicos grandes esse seu estatuto só faz sentido, para ter essa dimensão no presente e crescerem com ela no futuro, olhando estes jogos do "mundo Champions" como aqueles para que hoje devem verdadeiramente existir Não que o possam, em condições naturais, ganhar (o quadro competitivo macrocéfalo quase o veta) mas como onde têm de obrigatoriamente estar. Sob pena de, em rigor de definição de "clubes grandes", deixarem de o ser.
Esta linha de pensamento vale tanto para a realidade financeira como a futebolística. Nenhuma pode viver hoje sem a outra nesta dimensão. E a ordem não é arbitrária. Festejar a entrada (assalto legitimado) nesse mundo com tantas barreiras de segurança como antes se festejava ganhar uma dessas provas é, por isso, uma consequência lógica.
Estamos lá dentro. Encapuçados no banco do futebol europeu. Temos assaltantes para agora saber descobrir as chaves mais secretas.
O nosso mais pequeno mundo
Mesmo numa segunda linha competitiva, também o Braga percebeu a realidade paralela "casa de papel" que lhe permite atingir (e continuar a crescer) a todos os níveis. Está na Liga Europa e mete-se, irreverente, no meio das discussões maiores.
Depois disso, claro, encontramos o mundo onde vivem os comuns dos mortais. Sonhando, lutando, jogando.
Confirmou-se, naturalmente, como era utópico imaginar o Paços Ferreira eliminar o Tottenham. Foi romântico ver os "castores" entrarem em Londres a ganhar mas, depois (nem querendo inventar uma tática com três centrais e todos os defesas possíveis) não existia mais estrada para andar. Fiquei, porém, com a sensação que a equipa devia ter-se divertido mais (e crescido competitivamente para a época interna) a partir deste jogo e não o ter vivido com tanta tensão que lhe tolheu movimentos.
Custou mais ver cair o Santa Clara, sobretudo porque perdeu tendo vendido (para o futebol árabe) o seu melhor jogador e goleador, Carlos Júnior, entre os dois jogos com o Partizan. Bastava ter ficado mais uns dias e jogado esta segunda mão. Tinha, acredito, feito a diferença. Afinal, apenas mais um sinal da leveza do nosso tal pequeno mundo meramente terreno.