O debate à volta de Danilo e William não é só demasiado simplista e ideológico. Também é fraco de memória.
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Vamos puxar pela memória para falar a sério de médios defensivos, trincos, volantes, cabeças de área, como se houvesse um histórico a que pudéssemos recorrer, em vez de falar de cor.
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Lembram-se do Euro'2000? Do 3-0 à Alemanha de Mathaus, Ballack, Hassler, Kahn? Recordo-me bem porque cobri esse Europeu (e porque na semana passada não se falava de outra coisa). Costinha e Paulo Sousa, mais um defesa central a lateral direito (Beto), e nenhum médio ofensivo, só dois alas e dois avançados. E do 3-2 à Inglaterra? Vidigal e Paulo Bento.
Um par de verões mais tarde, despacharam-me para a Ásia. Estádio de Suwon, Coreia do Sul, uma orquestra mágica e um selecionador (barra maestro, barra visionário) inebriado pela nota artística do apuramento e pelos aplausos da fina flor do futebol. Do outro lado, um anónimo rebanho de americanos que a história viria a varrer num estalar de dedos. Para quê dois trincos? Marchou Petit sozinho, atrás de João Vieira Pinto, Rui Costa, Figo, Sérgio Conceição e Pauleta. Era uma sinfonia de trombetas celestiais nunca vista, várias delas talhadas naquela porcelana casca de ovo que lasca quando se corre para trás. Aos 36 minutos, os Estados Unidos desancavam uma das seleções favoritas ao Mundial (e em 2002 era mesmo) com 3-0 (3-2 final, já com Paulo Bento em campo, para "defender"). Jogo seguinte, Polónia. Avançam Paulo Bento e Petit: 4-0 para Portugal.
Destes factos, não se aprende que para ganhar se deve jogar com dois trincos. A lição é que também se ganha jogando com dois médios defensivos (e é até muito frequente, perguntem ao Chelsea campeão da Europa), como se ganhará, se calhar, sem nenhum, ou até já se ganhou sem ponta de lança. Desde que se saiba atacar e defender. Metade disso é que nunca chega.