PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
Corpo do artigo
1 Terá começado a ser treinador naqueles jogos (demasiados) em que ainda era jogador mas ia para o banco.
Ali, sentado, vendo o jogo com o nariz pela altura da relva, Rúben Amorim começou a meter o seu "bisturi de táticas" no relvado imaginário que se formava na sua cabeça. Foi este que lhe surgiu quando, por fim, se tornou treinador.
Casa Pia, Braga, Sporting. A carreira montada num "meteorito meticuloso" desenhada num sistema de defesa a "3", ensinando as assimetrias do 3x4x3 jogo a jogo, adversário a adversário, todos diferentes, todos iguais. O primado da boa organização defensiva e a libertação da criatividade ofensiva. Uma forma de ir do coletivo (a disciplina) à individualidade (a imaginação). Rigor e rasgo. Este Sporting está feito dessa matéria. É cigarra e formiga. É Palhinha e Pote. E pode ser também só (ou sobretudo) Matheus Nunes a levar a bola e o jogo, com cabeça e chuteiras, fazendo do corredor central um caminho para "jogar pensando".
2 João de Deus confirmou no fim que a ideia do sistema dos três centrais lançada pelo Benfica em Alvalade teve como motivação (entenda-se intenção prioritária) "encaixar" no jogo do Sporting para, assim, controlar melhor adversário e jogo.
Em geral, o tamanho dum adversário mede-se em função do medo que temos dele e, nessa opção, o Benfica mostrava que, nesta altura, o receio triunfou sobre a coragem na hora de defrontar este novo "onze verde 3x4x3 de Amorim". Curiosamente (ou estranhamente), Jesus tivera intenção (ou tentação) oposta ao defrontar o FC Porto, no Dragão. Não é por caso que nesta fez uma exibição personalizada (onde podia ter ganho) e em Alvalade fez uma exibição hesitante (em que acabou por perder).
3 Basta-lhe um olhar para ver a "sociedade de onze jogadores" que deve ser uma equipa. Sérgio Oliveira distribui uma ideia de futebol em cada bola que toca, em cada jogada que entra. A cultura tática superior do meio-campo deste atual FC Porto, com Uribe mais mordedor e a dupla criativa-organizadora Sérgio Oliveira-Otávio, faz da equipa de Conceição aquela que, após um início de época descoordenado, melhor consegue, neste momento, entender os "diferentes jogos" que cada jogo tem. Tem "trabalhadores com técnica" para isso.
Numa jornada em que se viu um dérbi que quase se tornou num infinito numero de duelos dentro de "cabines telefónicas", ver um sector inteiro a jogar de outra forma, fugindo a esses duelos, é algo que pode marcar diferenças entre candidatos. Os próximos grandes jogos internos do FC Porto (com Braga e Sporting) serão
Não há realidades iguais
Até que ponto um treinador pode entrar sempre com o seu modelo de jogo num clube? O mais terrível será quando os limites para essa possibilidade são o choque com a realidade.
O Rio Ave vai para o terceiro treinador da época, numa altura em que já não sabe bem se vai ao mesmo tempo à procura da ideia de jogo que fez a sua imagem de marca nas últimas épocas. Ou seja, os maus resultados e a quebra exibicional da equipa já pedem, neste momento, uma abordagem mais "pragmática/resultadista" do que de estética de jogo. Encontrar Miguel Cardoso disponível neste momento foi como ver uma essas duas "janelas" no mesmo treinador. O contexto que vai agora encontrar é, no entanto, muito diferente do que teve (para ele, que antes buscava lançar a carreira, e para o clube, com um plantel hoje de nível inferior). Vendo a quantidade de vezes que, na estreia no Dragão, pediu à equipa para, desde trás, "bater longo" em vez de "sair a jogar", viu-se essa sua perceção da nova realidade. Veremos agora como consegue subir a competitividade da equipa, à sua imagem, sem ceder tanto às suas ideias. Por mais forte que sejam as convicções, é impossível fugir aos contextos. Ser treinador (também) é saber viver ideologicamente neste "limbo existencial"