PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 Um jogo para mudar personalidade. Espírito e tática. Pondo cada um em seu sítio, o sistema de três centrais apoiado por três médios metidos num triângulo interior (5x3x2), preconizava uma rutura total com o 4x4x2 de "equipa partida" com meio-campo "a dois" e extremos.
No novo sistema, a densidade defensiva dava maior presença atrás e juntou sectores na organização defensiva. No fundo, "colou a equipa".
Desde o início, a equipa teve sempre dificuldade em desdobrar o sistema para 3x5x2. Os laterais subiam sobretudo em apoio e acabaram o jogo a "fechar a 5" (com Nuno Tavares no lugar de Grimaldo) e o meio-campo, apesar de ter Pizzi e Taarabt, não engatava um "bom passe de transição" para lançar o ataque na profundidade de Rafa (ou até Seferovic). As entradas de Gabriel e Everton (para os lugares desses dois elementos taticamente presos às missões defensivas/coberturas) visava soltar mais a equipa. O golo surgiu e a missão voltava a inverter-se. Os desígnios do jogo (uma "bola longa perdida") que o colocaram a ganhar (1-2) já na segunda parte, com meia-hora para jogar, criavam o cenário perfeito para a aplicação dessa estrutura no plano da segurança defensiva (segurar o resultado) e lançar o contra-ataque. Nenhum dos fatores surgiu.
2 Quando teve de aplicar da forma mais sólida o 5x3x2, as descoordenações da linha defensiva (quer no alinhar dos três centrais ou da "linha de 5", como na pouca ajuda de "encurtamentos" dos médios) condenaram, na prática, a (boa) ideia defensiva de Jesus. A falta de entrosamento entre Otamendi, Vertonghen e Lucas ficou destapada (como no 1-0) na falha de fazer linha fora-de-jogo: Lucas ficou, simultaneamente com a saída necessária de Otamendi a uma "bola descoberta".
Nas laterais, é evidente a pouca vocação de todos para aguentar posicionalmente nos momentos mais difíceis. Recordo, então, o que tenho, tantas vezes, sentido ser a origem da "crise tática encarnada": a lesão e falta de André Almeida (a chave do equilíbrio atrás da linha da bola).
3 A época "encarnada" (fora do título nacional e da Liga Europa) eclipsou-se. Lutar por um lugar de "Champions" é uma ironia para um projeto tão faraónico como desequilibrado. Para o salvar, a nível europeu, Jesus tentou inverter toda a lógica de como joga a nível interno. Mais do que um golpe estratégico, a equipa sentiu a mudança como um golpe na sua identidade. Ficou longe da baliza adversária quase o jogo todo e sentiu-se presa perto da sua com tantos jogadores. Em suma: o bloco (sectores juntos) nunca encontrou o local certo para se colocar. No final, faltou-lhe espírito e tática. A personalidade não se muda sem a preparar antes para isso.
Acabou a Liga Europa
Portugal ficou sem equipas na Liga Europa. Tão desolador como natural tal a dificuldade de fazer o "transfer estratégico" de como se joga a nível interno para como se deve jogar a nível internacional (algo que, sem preocupações estéticas, o FC Porto fez na Champions, com City e Juventus).
A realidade competitiva das equipas portuguesas vive num permanente contraste de exigências. André Horta, um jogador a falar melhor que qualquer treinador, disse-o no fim do jogo do Braga em Roma. Quando chegam a estes jogos, as nossas equipas sentem uma exigência de intensidade e ritmo competitivo que nunca encontram nos jogos nacionais. E pagam por isso.
É demasiado evidente. E não é por se jogar de três em três dias que a competitividade sobe. Pelo contrário. Na nossa mentalidade (sem treinar, só recuperando) até incentiva mais, no jogo, a planos de fuga competitivos que são suficientes para ganhar, tal a diferença de forças em confronto.
O futebol português necessita deitar-se taticamente no "divã" e fazer a sua psicoterapia competitiva. Sem ter medo do que vai encontrar em si próprio.
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André Horta, um jogador a falar melhor que qualquer treinador
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Benfica: o golo que o meteu a ganhar a meia hora do fim criara o cenário perfeito para o êxito da tática dos três centrais. Por que razão falhou?