Chamou os jornalistas para (quase) só falar de assuntos que determinam até que ponto pode ser, ou não, miserável o futebol do futuro em Portugal. Ou seja, nada de importante pelos nossos padrões.
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O Braga de António Salvador convocou ontem os jornalistas, incluindo este que escreve, para uma conversa a roçar o escândalo. Não se falou de arbitragem, não se falou de garagens, não se falou de claques, (quase) não se falou de outros presidentes, (quase) não se falou de comentadores, não se falou de realidades alternativas: só de problemas verdadeiros e completamente inúteis para o objetivo do jogo, que, como sabemos, consiste em piorá-lo.
Foi como ser raptado e levado para um OVNI, onde estranhas criaturas experimentaram em mim termos alienígenas como "horários de jogos", "carga fiscal", "quadros competitivos" e "assistências nos estádios". Por coincidência, li no mesmo dia uma censura ao presidente da Liga por nunca ter falado do caso da garagem do FC Porto.
Não me lembro de alguma vez Proença ter sido censurado pelo facto de não falar, ou não falar o suficiente, de horários de jogos, carga fiscal, quadros competitivos e assistências dos estádios, apesar de ser bastante claro que qualquer desses assuntos pesa infinitamente mais no futuro do jogo em Portugal (para clubes e adeptos) do que a garagem do FC Porto, as cláusulas do contrato de David Carmo ou o paradeiro, minuto a minuto, de Fernando Madureira.
O que António Salvador e a eloquente equipa de profissionais sentada à sua volta fizeram ontem foi tornar óbvia a diferença entre as palermices inúteis que consomem 99% do espaço de discussão e os temas que podem, de facto, conduzir a melhorias. E fê-lo com a autoridade de quem executou o melhor projeto do futebol português em mais de cem anos sem precisar de derrubar o "sistema", nem de revoluções na arbitragem, intrigas no Governo, na Assembleia da República ou no Ministério Público, campanhas de propaganda contra os adversários ou papagaios amestrados a inventar factos políticos nas televisões. Isto é, relevando o fundamental e ignorando o lixo.