SENADO - Uma opinião de José Eduardo Simões
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É notório que o FC Porto dos dias de hoje está longe dos níveis que já alcançou e levaram à conquista de títulos europeus e mundiais, e a ter uma supremacia incontestada a nível nacional.
As diferenças são muitas e notam-se bem. Desde logo na equipa dirigente - substituir Fernando Gomes (que foi para a Liga e agora é Presidente da FPF), Antero Henrique ou Reinaldo Teles não era tarefa fácil. A estrutura ressentiu-se e os treinadores (praticamente todos conquistaram campeonatos) deixaram de ser "peças" de integração fácil, com tempo e condições para trabalhar uma equipa de solistas e operários bem afinada em que o difícil era estragar o trabalho feito. O FC Porto funcionava como uma máquina oleada em que a substituição de treinadores e jogadores pouco alterava a forma de jogar e a capacidade do grupo.
A venda de jogadores (e muitas e boas que foram) eram preparadas com antecedência, tal como as entradas eram criteriosas nas escolhas, pois a prospecção trabalhava bem. Claro que havia um círculo vicioso positivo, pois os títulos atraíam os melhores, mas também é justo salientar que iam para o FC Porto treinadores e muitos jogadores que pareciam medianos ou eram desaproveitados noutros clubes e ali atingiam desempenhos altíssimos. A razão era simples. Sobre toda a estrutura, mas com respeito pela função de cada qual, estava Pinto da Costa, o super presidente que assegurava que a máquina funcionasse como se em regime de piloto automático, com os papéis bem definidos. Depois, tinha capacidade e inteligência para defender os seus e atacar estrategicamente os adversários que pudessem colocar em causa o poderio portista.
Contudo, nos últimos 10 anos, e sobretudo após a saída de André Villas-Boas (no que terá sido o canto de cisne do FCPorto poderoso, dominador e eficiente), tem-se vindo a acentuar a crescente dificuldade em vencer e contrariar a força do crescimento (ou renascimento) do Benfica. Durante mais de 30 anos após o 25 de Abril, o Porto encarnou e liderou mesmo, à sua maneira, a divisão norte/sul, o norte trabalhador contra os "centralistas preguiçosos e gastadores", os que tinham que fazer pela vida versus os que só precisavam de ir a um gabinete ministerial para conseguir vantagens e probendas. Os que pagavam impostos face aos que os malbaratavam. Os que não tinham poder perante os que o detinham e usavam em proveito próprio. Podemos dizer que o FC Porto assumiu-se um pouco à semelhança de um Barcelona, Marselha, Milan, Inter ou Juventus, Liverpool ou os de Manchester, até mesmo um Bayern de Munique nos respectivos países. Era uma estratégia clara e coerente, que permitiu sair da redoma de uma cidade (ou de parte dela) para se impor como potência nacional e internacional desportiva. Só que nenhuma estratégia deste tipo é eterna e os dirigentes têm que ser capazes de se adaptar aos tempos e suas nuances. Dos clubes atrás referidos só Barcelona, Marselha e FC Porto continuam a encarnar o espírito de rivalidade, ou antagonismo, face aos centralismos dos respectivos países. Os restantes adaptaram-se, continuaram a crescer, são potências mundiais por mérito próprio. E estão fortes, ao contrário dos outros, que se encontram mergulhados em dívidas, com passivos assustadores e enormes dificuldades em atrair, valorizar e manter (ou vender bem) os melhores atletas.
O FCPorto está a atravessar um caminho de pedras. Tem problemas financeiros agudos mas ainda é forte. Pode passar por dificuldades nas competições nacionais, mas transcende-se nas provas internacionais, como ocorreu na época transacta e ainda há poucos dias em Madrid contra o Atlético. Mas nesses palcos está a viver da garra e experiência, na força e coesão de uma equipa sem estrelas onde apenas alguns jogadores e o seu treinador sabem o que formou o espírito conquistador dos portistas. Para cimentar o futuro isso não é suficiente.