PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião da autoria de Luís Freitas Lobo.
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1 A contagem decrescente para o futebol voltar tem sido proporcionalmente fiel a retomar-se exatamente no ponto em que ficou.
As discussões inúteis, a falta de visão global do "problema" da indústria, o "umbiguismo cego" dos clubes, o oportunismo financeiro de quem tanto o sustenta como o engole (sem clubes não existiriam competições, transmissões e ponto final), os festivais de insultos televisivos, o "buraco negro" entre a Liga de uma pessoa só (que pode ir de 95,8% a 0,5% num pestanejar de interesses) e a Federação cada vez mais líder espiritual do negócio e seu destino.
É assim que estamos. Pelo meio, acreditem, vai aparecer uma bola, mesmo nesta espécie de "futebol de inseminação artificial" criado para nos salvar a todos da crise existencial e financeira. Tento concentrar-me na bola. Não é fácil porque não vivo com hábitos eremitas. É perturbante, mas confesso: começo a ter saudades da quarentena.
2 Lembram-se que existia um jogador chamado Gabriel? Ele e muitos como ele vão entrar nos estádios vazios com praias cheias ao lado. O lado disfuncional da dita "nova normalidade". Surreal ao lado do "Blade-Runner".
Vai ser possível substituir quase "meia equipa" durante um jogo. Mas, qual jogo? Continuará a ser só um que se irá jogar por cada 90 minutos? O que acabar pode ter jogadores completamente diferentes dos que o começaram em cada onze.
O futebol é um desafio de tática, técnica e resistência física e mental. Muitas vezes são os dois últimos que ganham os jogos, sobretudo na parte final. As cinco substituições (quando até a terceira é uma invenção recente das últimas décadas) subverte a essência desses fatores que faz disputar esse "jogo global" como existiu durante mais de um século. Não faz sentido. Nem pelas (falsas) razões circunstanciais do momento. Nem pelo bem do jogo jogado pelos treinadores.
3 O Gabriel é um médio do Benfica que pode ser decisivo, dentro do campo, nesta fase (os 10 jogos do "minicampeonato 2020") de regresso após se ter lesionado pouco antes da paragem pandémica. Foi, porém, o tempo suficiente para, sem ele, o Benfica perder o melhor futebol (equilíbrio da equipa em campo) e pontos sucessivos até perder também a liderança.
O importante, para mim, é falar deste futebol. Do possível impacto-Gabriel (como lancei o de Mbemba à esquerda na dupla de centrais e Vietto no melhor lugar que é o... mais perto da baliza possível como segundo avançado).
A partir da próxima crónica só serão admitidas neste meu espaço essas figuras. Treinadores e jogadores. Os homens do jogo. Até amanha (já como eremita existencial do verdadeiro futebol).
Meu Estádio, meu castelo?
A luta dos clubes para jogar nos seus estádios foi proporcionalmente mais intensa dependendo do que cada um ainda tem ainda para jogar na época. Para o Marítimo era impensável aceitar jogar fora do seu recinto (fora da sua Ilha, até) e, com essa enorme desvantagem, sujeitar-se, pelo risco da classificação, a descer de divisão. Lutou e bem pelo direito de ficar em casa.
O Santa Clara está tranquilo e pôde, assim, avaliar a situação de outra forma. O caso do Belenenses SAD a jogar "sem teto" ultrapassa a lógica. O mítico e belo Restelo fora do circuito da I Liga é, por tudo que motiva tal situação, a realidade mais chocante a que assisto no futebol português há épocas sucessivas. Não me interessa saber quem tem razão. É chocante e ponto.
Não entendo, também, uma competição profissional da I Liga (do país campeão da Europa) em que um clube não tem orçamento para um voo charter. Sei que são tempos difíceis mas uma coisa é uma crise conjuntural, outra é uma insolúvel realidade deficitária de longos anos numa terra lendária onde aprendi com o "Jota Jota" a gostar de futebol.