PLANETA DO FUTEBOL - Um artigo de opinião de Luís Freitas Lobo.
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1 O Benfica de Veríssimo tem, no contexto atual do futebol encarnado pós-tempestade Jesus, um plano de controlo de danos.
Quase não se pressente uma sombra de estados de alma. Nem ansiedade, nem serenidade. A equipa joga como que cumprindo as coordenadas dum "GPS de circulação de bola" e, perante um adversário fechado atrás, cumpre esse trajeto que, após ter-se perdido taticamente no caminho do 3x4x3 para o 4x4x2, buscou uma nova variante de jogo.
Em Arouca, a nuance passou por, após ler os erros posicionais de casting no jogo com o Moreirense, numa nova distribuição dos intérpretes do 4x4x2: puxou Paulo Bernardo para a zona interior (à frente de Weigl) e fez descair João Mário para a ala direita mas só para dar largura em apoio de circulação. Quando a equipa entrava nos últimos 30 metros, a jogada ofensiva já tinha a faixa entregue a Grimaldo, lateral subido em busca da profundidade, e João Mário a jogar por dentro, fazendo assim um 4x4x2 com... três médios (4x1x3x2) no corredor central.
Desta forma, controlou a posse e manteve o jogo em sossego. Sem mudanças de velocidade tornou, porém, esse circuito da bola controlável pela plantação defensiva arouquense em bloco baixo. Desencantou o golo num penálti subterrâneo de Darwin e ficou a ganhar.
2 João Mário perde influência a nível da importância do passe quando, neste sistema e dinâmica pedida, sai do seu território central. Paulo Bernardo é um jogador com visão de jogo mas não é um "associativo" por natureza. Precisa de ter missões (e confiança) para fazer ruturas quando recebe a bola. No centro da sonolenta circulação da bola, limitou-se a fazer um trabalho burocrático (tal como João Mário) dentro do tal mapa de jogo estabelecido. Mais do que darem vida ao sistema, os jogadores (sem cometerem erros) garantem a sua execução.
A passagem para 4x3x3 na segunda parte colocou ambos na zona central como interiores subidos do triângulo do meio-campo. Não acordou a equipa para outra velocidade, deixou até o jogo cair numa posse mais sonolenta, mas deu-lhe um posicionamento (em termos de ocupação de espaços) mais natural.
3 É compreensível que o Benfica não atravessa um período fácil para qualquer treinador e que isso pode levar a equipa a proteger-se mais no jogo. Uma proteção que provoca e traduz-se num baixar de ritmo e maior rigor posicional. A disciplina antes do rasgo. Neste contexto, um jogador como Otamendi cresce de tamanho para dar caráter à equipa a defender e impedir o adversário de crescer ofensivamente.
A mudança de sistema faz com que suspeite ainda mais de si própria. Perdeu a vertigem do jogo rápido de Jesus (que a partia) mas nesta toada de jogo apoiado em posse de Veríssimo (que a junta) ainda não conseguiu criar uma nova identidade.
O jogo como senso comum
O Sporting continua a não transmitir uma sensação de grande potência mas nenhuma outra equipa transmite maior ideia de consistência. Existe já um sentido comum do jogo que faz com que o onze nunca perca o sentido posicional em campo mas, mesmo assim, nunca cai na rotina (entenda-se previsibilidade para o adversário) porque, como princípio, a coerência nunca tem maus momentos. O interesse em Edwards encaixa na mesma leitura de características do jogador que, conciliadas com o seu talento, entra nessa linha de reforço dum estilo de jogo (modelo e sistema preferencial).
O entendimento do lado coletivo do jogo é o que torna as equipas mais fortes para resistir aos momentos mais difíceis numa partida (e usar os jogadores nos espaços mais específicos possíveis). Isto é, não lhes pedir trocas posicionais frequentes.
O alto nível diferenciador de Pedro Gonçalves e Sarabia resolve jogos mas nem nesses momentos de exaltação individual deixam de ser respeitadores do jogo posicional coletivo. Assim, o jogador mais imprevisível em termos de movimentos é mesmo o ponta-de-lança, Paulinho, n.º 9 a jogar em apoios ou em largura. É ele o elemento que mais confunde os adversários em termos de referências de marcação. A mais estranha e misteriosa forma de vida dum ponta-de-lança no nosso campeonato.