PLANETA DO FUTEBOL - Uma análise de Luís Freitas Lobo
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1 - Arrancou a época com uma das buscas mais importantes do futebol português: encontrar a quinta equipa europeia. Isto é, em vez de apurar mais equipas para essas provas (tantas vezes findas nas pré-eliminatórias), potenciar uma, além dos clássicos grandes mais o solidificado Braga, com capacidade para fazer caminho numa prova europeia (entrar nos grupos e ir longe). Se existe clube com essa margem de crescimento é o V. Guimarães.
A quinta equipa europeia passa pela reinvenção da força do Vitória
A questão é, porém, mesmo essa: como dar sustentação a esse crescimento num clube que ficou preso entre dois tempos da sua existência na entrada para o novo milénio em que, mesmo ao lado, emergiu a força-Braga (antes, atrás dos vitorianos), que a nível de estruturas (a construção Academia) e de resultados desportivos (com poder no futebol dos negócios) criou, hoje, um fosso entre as duas realidades.
2 - Com uma força social de raiz até superior, o Vitória necessita dum plano a médio/longo prazo para fazer esse mesmo caminho e reerguer o seu castelo (estruturas, poder e resultados). Não basta o curto prazo (indispensável) de vender para pagar esqueletos do passado. Percebo o querer ganhar no imediato (num local onde os adeptos abraçam a equipa com tanta força que às vezes a sufocam) mas o Vitória-clube como grande potência necessita mais do que a gestão "ad-hoc".
Uma estrutura sem estados de alma além dos 90 minutos. Numa frase: cada decisão do dia-a-dia tem de ter ao mesmo tempo a projeção de efeitos para anos seguintes. Nunca como hoje o edifício desportivo e financeiro (estratégias de gestão do clube e futebolística da equipa) teve de ter sempre as duas entradas cruzadas.
3 - Pensava nisso vendo aquele fantástico ambiente contra o Puskás Akadémia FC. O jogo ajudou a esse arrepio futebolístico. As jogadas do Jota Silva no estilo de meias em baixo (caneleiras curtinhas) lembra um jogador de outros tempo que fazia sonhar. E como joga muito. Tal como se vê que o André Silva sabe jogar (um nº 9 que procura a equipa antes da baliza) e André Almeida é um nº 8 que assume a bola e (agressivo-técnico) come metros em posse. Este romance não pode, porém, ser só amor de uma noite futebolística de verão. Tem de ser para as quatro estações de cada longa época. Não é fácil, mas para atingir esse nível há um caminho das pedras a fazer e que, a certo ponto, obrigará o clube a libertar-se de dogmas do passado.
O forte-Braga atual nasceu e cresceu assim. Libertou-se dos tentáculos da Câmara, saiu das mesas dos cafés da cidade, criou a sua rede de contactos e influências, ergueu estruturas e património como nunca teve e passou a mexer-se com autoridade no futebol do negócio e empresários. O Vitória necessita dessa reinvenção. Tem as bases sóciodesportivas para isso. Precisa do plano e da sensibilidade e sabedoria de gestão financeira e desportiva. A (médio) longo prazo.
A geometria segundo Trincão
Continuo a falar de talento. Desta vez, penso como ele é o maior tesouro que um jogador, porque só ele dá a alucinante possibilidade de, no futebol, se poder viver três vezes (duas é normal e há quem até viva mais).
O regresso de Trincão aos nossos relvados como que repõe a sua carreira nos trilhos naturais da evolução do seu talento, um craque a quem vestiram a camisola do Barcelona quando nascia no Braga. A camisola que o parecia transportar para um conto de fadas ficou-lhe naturalmente grande. Passou pelo aconchego natural do Wolverhampton e entra agora no Sporting onde, pensando no sistema de Amorim, encontra um duplo desafio tático: transformar-se ao mesmo tempo a ele próprio (ser mais jogador de zonas interiores) e à equipa (através do que as suas características podem dar em termos de novas nuances de movimentação ofensiva).
No fundo, cruzando esta duplicidade individual e coletiva, terá de ser menos jogador de faixa viciado nas diagonais de fora para dentro. Mais do que ter lateral e extremo no mesmo corredor um à frente do outro, o jogo leonino quer que eles, nos últimos 30 metros joguem... lado a lado. Com o ala a desaparecer (vira segundo-avançado) e o lateral a surgir (vira extremo). Ilusionismo.